Comentário Exegético – XXII Domingo do Tempo Comum – Ano B

EPÍSTOLA (Tg 1, 17-18.21b,22-27)

(Pe. Ignácio, dos padres escolápios)

 

INTRODUÇÃO: Chamados como primícias da palavra, não devemos unicamente contentar-nos em ouvi-la. Ela deve ser a razão da nossa conduta, para não sermos mera especulação como homens que se olham no espelho, e imediatamente esquecem qual foi sua figura. Pois a religião verdadeira é aquela que cuida dos necessitados e se vê livre das atrações e tentações do mundo.

     DEUS AUTOR DE TODO BEM: Toda dádiva boa e todo dom perfeito é do alto descendendo do Pai das luzes para o qual não há mudança nem sombra de variação (17). Omne datum optimum et omne donum perfectum desursum est descendens a Patre luminum apud quem non est transmutatio nec vicissitudinis obumbratio. DÁDIVA [dosis<1394>=datum] como em Fp 4, 15: Nenhuma igreja comunicou comigo com respeito a dar e a receber, senão vós somente. DOM [dörema<1434>=donum]: em ambos os casos o adjetivo indica bondade- agathë [boa] e teleion [perfeito]- que unicamente tem como causa eficiente o Pai. Por isso, fala de que a sua procedência é do alto, onde se entendia estava a divindade. Do PAI DAS LUZES [tou Patros<3962> tön fötön<5457>=a patre luminum] Deus é luz, pois esta é a mensagem que dele ouvimos, e vos anunciamos: que Deus é luz, e não há nele trevas nenhumas (1 Jo 1,5). Deus é o autor das luzes, das corporais como o sol, a lua, as estrelas já que no Gênesis criou a luz (Gn 1, 3), mas também das constelações do dia e da noite  (idem 14) e das estrelas  (idem 16) de modo que a ausência divina são as trevas, não unicamente materiais, mas também do espírito; luz que os homens rejeitaram porque amaram mais as trevas (Jo 3, 19). Sempre que aparece, é visto rodeado de luz como na nuvem do Tabor (Mt 17, 5), ou as vestes de seus anjos ou mensageiros (Lc 24, 4). Sendo plena luz, Tiago pode afirmar que nEle, Deus, não há variação ou sombra de intensidade. Os astros, o sol e especialmente a lua estavam sujeitos às variações de luz. Eram criaturas com os defeitos da imperfeição e caducidade que acompanham as mesmas.

CRIAÇÃO DO HOMEM: Voluntariamente nos criou com palavra de verdade para sermos princípio de qualquer das suas criaturas (18). Voluntarie genuit nos verbo veritatis ut simus initium aliquod creaturae eius. VOLUNTARIAMENTE [boulëtheis<1014>=voluntarie]: em Lc 22, 42 encontramos o mesmo verbo com o significado de querer: ninguém conhece o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar. De modo que podemos traduzir: unicamente pelo seu bem querer nos criou, COM PALAVRA DE VERDADE: seguramente aqui Tiago recorda o Gênesis em que a criação toda começou a existir pela palavra: e disse Deus. Palavra que o apóstolo chama de Verdade porque corresponde à vontade de Deus que sempre tem como finalidade uma determinada ação e não um desejo inacabado. PRINCÍPIO [aparchë <536>=initium]: o latim pode confundir, pois initium refere-se principalmente ao tempo e aqui está considerando a criação do primeiro homem e esse aparchë, cujo significado era o de ser os primeiros frutos a serem consagrados e oferecidos em ação de graças; mas também primeiro como principal. Assim,  Cristo ressuscitou dentre os mortos, e foi feito as primícias dos que dormem (1 Cor 15, 20). Unindo ambas interpretações, podemos pensar que o homem é dentre as criaturas a principal e que deve ser como essência e remate da criação consagrada ao seu Criador.

 A NOVA PALAVRA: Recebei a implantada palavra poderosa para salvar vossas vidas (21). Suscipite insitum verbum quod potest salvare animas vestras. Na leitura epistolar são suprimidos dois versículos e meio, que vamos incluir aqui como parêntesis (sabeis estas coisas meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar [19]. Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus [20]. Portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de maldade [21ª]). É uma explicação do versículo anterior em que a palavra ficava um tanto indecisa. Como palavra de Verdade não pode ser a palavra humana que geralmente é palavra de ira, mas palavra divina IMPLANTADA [emfoton<1721>=insitum]  que é um apax e que significa implantar, ou seja, como semeada divinamente por usar a passiva. Palavra que é PODEROSA [dynamenon<1410>=quod potest] para a salvação. Evidentemente essa palavra é a de Jesus, LOGOS [=palavra] do Pai, Filho Unigênito em cujo sacrifício estava a redenção [apolypolitrosis] e cuja carne e sangue eram a comida e bebida da vida. Nisso estava a salvação.

     PRÁTICA DA PALAVRA: Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não só auditores que se iludem a si mesmos(22). Estote autem factores verbi et non auditores tantum fallentes vosmet ipsos. Mas parece que, aqui, é a palavra como saída da boca de Jesus, como anúncio do Reino a que interessa ao nosso autor. PRATICANTES [poiëtai<4163>=factores]: poiëtës é aquele que atua, que opera ou faz. A frase relembra a paulina de Rm 2, 13: Os que ouvem a lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados. Quem foi primeiro, Paulo ou Tiago a usar a mesma frase? Autores modernos datam esta epístola como o primeiro escrito do Novo Testamento redatado cerca do ano 47, anterior ao Concílio de Jerusalém. Logo Paulo o conhecia e repetiu a frase em seu escrito aos romanos. Porém, ambos os escritos refletem a palavra de Jesus: Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus (Mt 7, 21).

  EXEMPLO: Porque se alguém é ouvidor da palavra e não a pratica  este se assemelha a um homem considerando o rosto de seu nascimento em (o) espelho (23). Porque contempla a si mesmo e se retirou e, de imediato, se esqueceu como era (24). Quia si quis auditor est verbi et non factor hic conparabitur viro consideranti vultum nativitatis suae in speculo. Consideravit enim se et abiit et statim oblitus est qualis fuerit. Com um exemplo Tiago ilustra a diferença entre o cumpridor da palavra e o simples ouvinte da mesma: este último é como um homem que se olha no espelho [esoptropon<2072>=speculo] e que logo se esquece do rosto que nele se refletiu. Logicamente o espelho é a palavra que compara a vida e costumes do ouvinte com a Lei nova de Cristo. Se o ouvinte nada faz é como se esquecesse o que ouviu e nada tivesse acontecido.

  O QUE REALIZA A PALAVRA:  Mas quem olha para a Lei perfeita da liberdade e permanece, esse não auditor esquecido se tornado, mas fazedor de obra, este bendito em sua obra será (25). Qui autem perspexerit in lege perfecta libertatis et permanserit non auditor obliviosus factus sed factor operis hic beatus in facto suo erit. A imagem do espelho é substituída pela realidade da LEI PERFFEITA DA LIBERDADE [nomon <3551>teleion<5046>tës eleutherias<1657>=lex perfecta libertatis]: Segundo Tiago, não devem os cristãos se queixar [no sentido de levar a juízo?] uns contra os outros, para não serem condenados, pois o juiz está perto (Tg 5, 9). Desta frase deduzimos que a carta foi escrita antes da destruição de Jerusalém, pois fala do ser julgado [verbo krinö] que em sentido bíblico indica condenar que o juiz [kritës] realizará como castigo. E em 2, 12 o mesmo apóstolo fala como devendo ser julgados pela lei da liberdade. Segundo Paulo, os cristãos foram chamados à liberdade (Gl 5,13 ) de modo que a consciência de cada um não deve ser julgada pela consciência do outro (1 Cor 10, 29). Liberdade que, segundo Pedro, não deve ser usada como pretexto de malícia [para fazer o mal], mas vivendo como servos de Deus (1 Pd 2, 16). Disso tudo deduzimos que as leis dos homens, de vossa tradição (M 13, 52) segundo Jesus, não devem ter valor e delas estamos livres pela nova Lei do NT que Tiago diz ser perfeita e que Jesus resume em amar a Deus com toda a alma e ao próximo como a si mesmo (Mt 22, 37), que em João terá como modelo o próprio amor de Cristo (13, 34).

    A LÍNGUA COMO PROVA: Se alguém pensa ser religioso, entre vós, não dominando sua língua, engana seu coração, sua religião é vã (26). Si quis autem putat se religiosum esse non refrenans linguam suam sed seducens cor suum huius vana est religio. Neste ponto, Tiago volta a sua preferente moral que é o domínio da língua. Esta é a cara externa da personalidade de modo que reflete o interior do homem. Como dizia Jesus é do interior que o mal contamina (Mc 7, 20). ENGANA [apatön<538>=seducens] particípio de presente do verbo apataö, enganar, iludir. Se, pois, alguém pensa ser religioso deve dominar sua língua; pois de outro modo esse tal está enganado. Tiago fala do CORAÇÃO [kardia<2588>= cor] que era em tempos de Jesus a origem dos pensamentos e desejos onde não cabiam os alimentos, que iam para o ventre  e, portanto, não podiam impurificá-lo (Mc 7, 19). O que, pois, não domina sua língua é um religioso de religião falsa. Por isso relata na continuação as características da verdadeira religião.

      VERADADEIRA RELIGIÃO: Religião limpa e sem mácula para Deus e Pai é esta: visitar órfãos e viúvas na sua aflição, manter-se incólume do mundo (27). religio munda et inmaculata apud Deum et Patrem haec est visitare pupillos et viduas in tribulatione eorum inmaculatum se custodire ab hoc saeculo. Antes de mais nada, quem deve julgar sobre a verdade de uma religião é Deus, o Pai. E esta tem como distintivo a caridade: visitar órfãos e viúvas, como diz Isaías que parece serem os seres de cuidados especiais do Senhor, que em Dt 27, 19 afirma: Maldito aquele que perverter o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva. E todo o povo dirá: Amém. Mas além dessa positividade existe um negativo que não pode ser esquecido: manter-se incólume do mundo. A impureza dos alimentos que só podia atingir o ventre está no NT substituída pela abstenção dos pensamentos e prazeres do mundo. Sabemos que os fariseus tinham como preceitos principais o jejum e os dízimos (Lc 18,12), e como prêmio de suas orações, a riqueza que certamente contraria  o espírito evangélico como orgulho farisaico que se tornava desprezo dos ham haaretz [povo humilde da terra].

 

EVANGELHO (Mc 7,1-8; 14-15; 21-23)

(Pe. Ignácio, dos padres escolápios)

 

LAVAÇÃO COMO PURIFICAÇÃO: E reuniram-se junto a Ele [Jesus] os fariseus e alguns dos escribas vindos de Jerusalém (1). E tendo visto alguns dos discípulos dEle com mãos comuns comendo pães comuns, isto é, sem lavar, censuraram (2). Porque os fariseus e todos os judeus se não lavam até o punho as mãos não comem, conservando a tradição dos anciãos (3).  E depois da praça, se não tomam banho, não comem e outras muitas são as que granjearam guardar: lavados de copos e jarros e chaleiras e leitos (4). Et conveniunt ad eum Pharisaei et quidam de scribis venientes ab Hierosolymis. Et cum vidissent quosdam ex discipulis eius communibus manibus id est non lotis manducare panes vituperaverunt. Pharisaei enim et omnes Iudaei nisi crebro lavent manus non manducant tenentes traditionem seniorum.Et a foro nisi baptizentur non comedunt et alia multa sunt quae tradita sunt illis servare baptismata calicum et urceorum et aeramentorum et lectorum. Os fariseus eram em número de 20 mil e estavam espalhados por toda a Palestina. Já os escribas ou doutores da lei, tinham sua morada principal em Jerusalém. A fama de Jesus e sua rebeldia contra certos preceitos da Lei como o sábado, o tornavam alvo de uma perseguição inquisitorial. Desta vez o objeto de suas intrigas foram os discípulos. COM MÃOS COMUNS [koinais <2839>cherais <5495>=communibus manibus] É uma maneira de dizer que não lavavam as mãos. Havia dois momentos em que todo judeu autêntico devia lavar o corpo ou parte do mesmo: 1o) Antes de uma refeição, especialmente de pão. 2o) Após voltar das ruas da cidade, em cujo caso era necessário tomar um banho. À parte existia o preceito de lavar todos os vasos e recipientes usados na comida e bebida. Eles eram submergidos em água, fria ou quente, dependendo do uso. Para isso existiam, nas casas, recipientes de água de aproximadamente 40 l de capacidade cada um, as talhas de pedra, como vemos em Jo 2, 6. Segundo lemos em autores judeus da época, era necessário lavar as mãos até o cotovelo (batismo como diz Marcos), se a comida era de um sacrifício, ou se partilhava a refeição com um homem idoso; ou se se tratava de pão. E somente os dedos, se a comida era comum. Os escribas afirmavam que se as mãos eram impuras todo o corpo se tornava impuro. Aquele –dizia Rabi Eleazar- que despreza o lavado das mãos devia ser desenraizado da terra, porque na lavação  está o segredo do decálogo. Quem deve ser considerado como um plebeu ou povo ruim? Aquele que não come com limpeza ou pureza legal. Por isso se distingue um judeu de um gentio, na lavagem das mãos. No caso particular de comer o pão (era o nosso pão sírio) sem lavar as mãos, era como se deitar com uma mulher da vida, afirmava Rabi Josef. Os discípulos de Jesus iniciaram sua refeição que era basicamente uma comida consistente em pão de cevada, em forma de um disco de 12 cm de diâmetro e de uma espessura como de um dedo, sem lavar as mãos e talvez sem a bênção de ação de graças. Temos visto o que se pensava em círculos cultos e tradicionais sobre o assunto. A tradição dos antigos, especialmente dos dois chefes das escolas mais famosas da época, Hillel e Shammai, era muita estrita. Rabi Ishmael declarava: “As palavras da lei são palavras que contém tanto proibições como permissões, algumas delas leves, outras graves. Mas as palavras dos escribas todas são graves. As palavras dos escribas são mais pesadas que as dos profetas”. Por isso existia o seguinte conselho: “Aquele que transgride as palavras dos escribas é réu de morte”. Especialmente para comer o pão era necessário lavar as mãos porque o pão era considerado coisa sagrada, já que o pão representava toda comida. Por exemplo, para comer frutas não era necessário o lavado das mãos. Hillel e Shammai foram os que restabeleceram a tradição. Por isso clamavam: “Aquele que abençoa o pão com mãos impuras é réu de morte”. E para ameaçar os espíritos pusilânimes falavam de Shibta, uma sorte de mau espírito, que se assentava nas mãos e na cabeça do transgressor. Rabi Aquiba estava na prisão e preferiu antes morrer que comer sem lavar as mãos e por isso usou o pouco de água que ele tinha para lavar suas mãos antes de beber da mesma. Com estas citações vemos como era importante a matéria que Marcos descreve e que Jesus de modo tão eficiente soluciona. O BATISMO: No versículo 4 fala Marcos de batismo do corpo e dos diversos recipientes. Parece uma exageração, mas na realidade o evangelista só expressa o que era de uso na época. Temos falado do banho corporal após vir das ruas. Mas os diversos recipientes também eram submergidos na água para se purificar. Marcos fala de diversos vasilhames como copos, sextários (= recipientes de 5 litros para vinho e água), vasilhas de bronze, e leitos. Os recipientes de cobre são especialmente nomeados porque se fossem de argila, eram destruídos uma vez tornados impuros. Um exemplo: pratos eram lavados antes do café da manhã, logo antes da refeição do meio-dia e logo antes da ceia noturna. O lavado era uma imersão (batismo) em água. Parece uma exageração o lavado dos reclinatórios nos quais os judeus se recostavam para os banquetes. Mas é uma realidade histórica. Em primeiro lugar todo recipiente comprado de um gentil devia ser submergido para tirar dele a contaminação. As mesas e as camas de madeira também eram incluídas nessa purificação. Especialmente as camas se o dormente morria nela, ou uma mulher menstruada ou um homem com blenorragia deitava nela, ou ainda se tivesse sido a cama de uma parturiente. O sangue derramado tornava impuro o leito. Até os travesseiros, se tinham capa de couro, comum na época, deviam ser purificados submergindo-os em água. A descrição do evangelista é, pois, exata mais do que correta.

A PERGUNTA: Então o interrogam os fariseus e os escribas: por que os teus discípulos não andam segundo a tradição dos anciãos, mas com mãos sem lavar comem o pão?(5) Et interrogant eum Pharisaei et scribae quare discipuli tui non ambulant iuxta traditionem seniorum sed communibus manibus manducant panem? Visto o que temos relatado, o escândalo farisaico era monumental. Como não perguntar ao Mestre, responsável pela educação e moral dos discípulos?

     A RESPOSTA DE JESUS: Ele, pois, tendo respondido lhes disse: que bem profetizou Isaías sobre vós, os hipócritas, como está escrito: Este povo com os lábios me honra, mas o seu coração longe está de mim (6). Em vão, pois, me adoram ensinando ensinamentos prescrevidos pelos homens (7). Porque negligenciando o mandato do Deus, guardais a tradição dos homens: as lavagens [baptismata] de cântaros, e copos e outras muitas similares [vasilhas] fazeis (8). At ille respondens dixit eis bene prophetavit Esaias de vobis hypocritis sicut scriptum est populus hic labiis me honorat cor autem eorum longe est a me. In vanum autem me colunt docentes doctrinas praecepta hominum. Relinquentes enim mandatum Dei tenetis traditionem hominum baptismata urceorum et calicum et alia similia his facitis multa. Jesus distingue perfeitamente entre mandatos (entolë) de Deus e preceitos (entalma) dos homens. Por isso Jesus se queixa como se queixa de seu tempo Isaías, de que os seus conterrâneos honram a  Deus com os lábios, mas seus corações estão longe dEle. E como argumento principal cita o que está escrito em Isaías 29, 13: “O Senhor disse: Visto que este povo se aproxima de mim e com sua boca e com seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que maquinalmente aprendeu…”. A citação servia como anel no dedo, nas circunstâncias.

ADVERTÊNCIA AO POVO: E chamando todo o povo lhes dizia: Escutai-me todos e entendei (14). Nada há fora do homem que entrando dentro dele pode contaminá-lo; mas as procedentes dele, essas  [coisas] são as que contaminam o homem (15). Et advocans iterum turbam dicebat illis audite me omnes et intellegite. Nihil est extra hominem introiens in eum quod possit eum coinquinare sed quae de homine procedunt illa sunt quae communicant hominem.

O INTERIOR DO HOMEM: Porque de dentro do coração dos homens os pensamentos, os malignos, surgem: adultérios, fornicações, homicídios (21). Furtos, avarezas, maldades, engano, licenciosidade, olho maldoso, blasfêmia, soberba, insensatez (22). Ab intus enim de corde hominum cogitationes malae procedunt adulteria fornicationes homicidia. furta avaritiae nequitiae dolus inpudicitia oculus malus blasphemia superbia stultitia. Na leitura da epístola faltam os versículos 16-20. Neles Jesus explica aos discípulos por que o que entra do exterior não pode contaminar o homem: porque entra via digestiva e passa pelo ventre sem que tenha contato algum com o coração, órgão do sentimento e da inteligência. É dentro desse coração que as coisas se contaminam, pois é onde surgem os PENSAMENTOS [dialogismoi<1261>=cogitationes] os que são MALIGNOS [kakoi<2556>=malae] e além disso, Jesus cita outras maldades frequentes entre os homens: ADULTÉRIOS [moicheiai <4202> =adulteria] FORNICAÇÕES [porneiai <4202> = fornicationes] HOMICÍDIOS [fonoi<5408>=homicidia] FURTOS [klopai<2829>=furta] AVAREZAS [pleonexia] <4142> =avaritiae],ENGANO[dolos<1388>=dolus], LICENCIOSIDADE [aselgeia<766>=impudicitia] ou lascívia, OLHO MAU [ofthalmos <3788> ponëros<4190>=oculus malus] que traduzem por inveja, BLASFÊMIA [blasfëmia <988> =blasphemia], SOBERBA [yperëfania <5243> =superba], INSENSATEZ [afrosynë<877>  =stultitia]. A enumeração dos vícios e maldades é quase exaustiva.

OS CONTAMINANTES VERDADEIROS: Todas estas coisas más de dentro surgem e contaminam o homem (23). Omnia haec mala ab intus procedunt et communicant hominem. Esta é a conclusão verdadeira que remata o razoamento de  Jesus: o que provém de fora não contamina o homem; mas é de dentro que aceitando e animando sentimentos malignos o homem se torna efeito e causa do mal. Se a repreensão anterior era dirigida aos fariseus, agora Jesus se dirige ao povo: Escutai todos e entendei. Era uma lição magistral que Jesus exige ser bem assimilada. Nada de fora pode contaminar, ou tornar impuro um homem, entrando nele. Mas o que sai de dentro do mesmo, é o que o suja e envilece. Com isto Jesus declara nulas todas as leis de impureza ao mesmo tempo em que afirma que a impureza nada tem a ver com o pecado. A impureza  não afasta o homem de Deus como o pecado, pois este consiste em não cumprir as leis divinas. E Jesus enumera uma série de instintos internos, fontes de pecado que dão origem aos mesmos e que se realizados tornam o homem profano e vil perante Deus. Temos traduzido da melhor maneira possível, tendo em conta diversos textos, cuja origem é o grego e do qual pretendem ser traduzidas. São, pois, estas tendências más as seguintes: fornicações, roubos, homicídios, adultérios, cobiça (avareza), degradação (maldade, perversidade), fraude (engano), lascívia (desenfreamento), inveja (olho mau), blasfêmia, orgulho (arrogância), insensatez (estupidez). Tudo isso é que torna um homem contaminado, profano com respeito a Deus, que é sagrado por excelência.

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