Homilia do D. Anselmo Chagas de Paiva – XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A

Parábola dos talentos
Mt 25,14-30

Caros irmãos e irmãs,
O trecho evangélico escolhido para este domingo é a parábola dos talentos. O texto nos diz
que um homem, ao ausentar-se para uma viagem, distribuiu talentos a três servos, para que tomassem
conta deles e os fizessem frutificar. A um deu cinco talentos, a outro, dois; e a um terceiro, apenas
um talento. O talento era uma antiga moeda romana, de grande valor. Cada talento correspondia a
um salário de vinte anos de trabalho de um operário comum; algo semelhante a 35 quilos de ouro;
portanto, uma grande quantia; seria algo em torno de 3,5 milhões. Logo, mesmo aquele que recebeu
só um talento, recebeu uma enorme quantia; o que sublinha a imensa generosidade de Deus nos seus
dons.
A cada um ele os deu “conforme a sua capacidade” (v. 15), para que esses dons pudessem ser
desenvolvidos e usados para fazer o bem a si mesmo, aos outros e ao Reino de Deus. O servo que
recebera cinco talentos negociou e conseguiu lucrar mais cinco. O que recebera dois, negociou
também e lucrou outros dois. O terceiro, porém, sem coragem e omisso, escondeu debaixo da terra o
talento recebido, para devolvê-lo na volta ao patrão. No retorno do patrão, os dois primeiros
entregaram o lucro conseguido, e foram elogiados, o que o fez confiar a eles quantias maiores e os
convidou: “Vem participar da minha alegria!” (v. 21).
Ao terceiro, que entregou o talento que guardara escondido, temendo as exigências do patrão,
recebeu severas admoestações: “Servo mau e preguiçoso!” (v. 26). E mandou que tirassem o talento
e o entregassem ao que tinha dez. Em seguida, foi ele lançado nas trevas, onde haveria choro e
ranger de dentes (cf. v. 30) .
Na parábola o patrão louva os discípulos que se empenharam em fazer frutificar os bens
confiados a eles; e condena o discípulo que se instala no medo e na preguiça e não põe a render os
talentos a ele confiados. Em conformidade com a lei rabínica, o ato de enterrar o dinheiro era
considerado a forma mais segura contra o roubo ou eventuais guerras. Se a uma pessoa fosse
confiada uma quantia em dinheiro e ela o enterrasse tão logo estivesse em seu poder, ela estaria livre
da culpa se algo acontecesse. Nesta parábola o patrão inverte o entendimento da lei rabínica. Ele
considerou enterrar o talento, como um prejuízo inaceitável, pois ele pensava que o capital deveria
receber uma taxa de retorno razoável.
O patrão que seguiu em viagem deixou um total de 8 talentos; ao retornar, os 8 haviam se
transformado em 15. Mas, o ganho de uma pessoa não ocorre à custa de um outro. O
empreendimento eficaz do primeiro servo não prejudica as possibilidades do terceiro servo. Isto
indica que seremos julgados, no juízo final, individualmente, não no conjunto.
Nesta parábola, o patrão pode ser identificado com o próprio Jesus que, antes de deixar este
mundo, entregou bens consideráveis aos seus servos, ou seja, os discípulos. Os talentos são os dons
que Deus, através de Jesus, ofereceu aos homens. Eles podem ser a Palavra de Deus, os valores do
Evangelho, os sacramentos, o amor, a partilha, a misericórdia, a fraternidade e também o perdão, que
o Senhor nos concede, sobretudo, no Sacramento da Confissão. Esses talentos recebidos devem dar
frutos copiosos, sobretudo através do nosso testemunho. São os bens mais preciosos que recebemos
do Senhor. Trata-se de um grande patrimônio que Ele nos confia. Nossa responsabilidade está em
conservar todo este patrimônio, mas também fazê-lo multiplicar. Nós somos os depositários desses
bens. Eles devem dar frutos e não podem ser enterrados.

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Na perspectiva da nossa parábola, esses talentos que Jesus deixou aos seus discípulos
necessitam dar frutos. A parábola apresenta os dois servos que investiram e multiplicaram os talentos
recebidos como referência para cada um de nós. Eles se preocuparam em não deixar parados os
talentos recebidos do patrão, fizeram investimentos, não se acomodaram e não se deixaram
influenciar pelo medo. A parábola condena fortemente o servo que devolveu intactos os bens
recebidos. Ele teve medo e, por isso, não correu riscos; não tirou desses bens qualquer fruto e
impediu que os bens do seu senhor se desenvolvessem.
Através desta parábola, o Evangelista São Mateus nos exorta a estarmos alertas e vigilantes.
Não podemos esquecer os compromissos assumidos com o Cristo Senhor. O cristão não pode deixar
na gaveta os dons recebidos de Deus. No mundo, somos as testemunhas de Cristo. É com o nosso
coração que Jesus continua a amar os pecadores do nosso tempo; é com as nossas palavras que Jesus
continua a consolar os que estão tristes e desanimados; é com os nossos braços abertos que Jesus
continua a acolher cada irmão que está sozinho e abandonado.
Os dois primeiros servos da parábola que, talvez correndo riscos, fizeram frutificar os bens
recebidos do patrão, mostram como devemos proceder, enquanto caminhamos pelo mundo à espera
da segunda vinda de Jesus. Aquele servo que escondeu o talento sem o valorizar, comportou-se
como se o seu dono não voltasse mais, como se não chegasse o dia em que lhe seriam pedidas as
contas da sua ação. Com esta parábola, Jesus quer ensinar aos seus discípulos como melhor usar os
dons recebidos de Deus, que chamou cada homem à vida e a ele deu muitos talentos. Ao comentar
esta página evangélica, São Gregório Magno observa que o Senhor não deixa faltar a ninguém a sua
caridade, o seu amor: “Por isso, meus irmãos, é necessário que dediqueis toda a atenção na
conservação da caridade, em cada ação que deveis realizar” (S. GREGÓRIO MAGNO, Homilias
sobre os Evangelhos 9, 6).
O buraco feito no terreno pelo servo mau e preguiçoso (cf. v. 26) indica o medo de arriscar,
que bloqueia a fecundidade do amor. Em um primeiro momento, a parábola parece falar dos bens
materiais por causa da entrega dos talentos, ou seja, da enorme quantia recebida pelos três servos.
Mas, na verdade, o grande tesouro que Jesus deixa em nossas mãos para fazer frutificar é sua Palavra
divina. Não podemos guardar na gaveta a Palavra de Deus, mas, sim, fazê-la circular na nossa vida,
nos nossos relacionamentos, nos nossos ambientes. São Paulo ressalta que a pregação do Evangelho
produz frutos e cresce a partir do momento que o povo escuta e conhece a verdade e a graça de Deus
(cf. Cl 1,6). Este é o grande talento deixado por Jesus: A palavra pregada, a Palavra escutada, a
Palavra que se torna graça e verdade.
Saibamos ficar atentos e vigilantes, como nos exorta a parábola. O Senhor, quando voltar irá
cobrar de cada um de nós os frutos do seu amor. A caridade é o bem fundamental que ninguém pode
deixar de fazer frutificar (cf. 1Cor 13,3). O patrão ficou feliz com os administradores fiéis que
multiplicaram os talentos recebidos. Mas, ficou ofendido com aquele que por medo e preguiça,
enterrou o talento. Isso mostra que não podemos permitir que o medo, que vem da falta de fé, ou a
preguiça, nos leve a enterrar nossos talentos, deixando-os infrutíferos.
Peçamos a intercessão da Virgem Maria, para que sejamos "servos bons e fiéis" e para que,
praticando a caridade, possamos um dia participar "na alegria do nosso Senhor". Assim seja.

D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ

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