Unidade com o Papa
No dia 9 de novembro, a Igreja celebra a festa, o aniversário, da dedicação da Basílica de
Latrão, a Catedral do Papa, Bispo de Roma, chamada “a primeira entre todas as Igrejas; ou
seja, a Igreja-mãe de Roma”, a primeira em dignidade. Surgiu no século IV e é dedicada ao
Divino Salvador. Foi construída, em Roma, depois do Edito de Milão, do Imperador
Constantino, que, em 313, concedeu aos cristãos a liberdade de praticar a sua religião. A festa
é celebrada, em toda a Igreja, como sinal de amor e de unidade com o Papa. Após a paz
constantiniana, tornou-se a moradia do Papa. Numerosos e importantes concílios ecumênicos
tiveram lugar nela. A dedicação daquela Basílica marcou a passagem e a saída da assembleia
cristã, do interior das catacumbas para o esplendor das basílicas.
Nossa atenção não fica presa apenas na evocação do fato; na dedicação da Basílica
Lateranense, cada comunidade cristã, da Igreja Latina, recorda e celebra a dedicação da
própria igreja, pequena ou grande que seja. Mais: nós temos, hoje, a ocasião para nos
perguntar sobre o significado mesmo da Igreja- edifício na qual nos reunimos cada domingo;
consideremos, enfim, “o mistério do templo”.
A Palavra de Deus, nesta solenidade, recorda uma verdade fundamental; o templo de pedra é
símbolo da Igreja viva, a comunidade cristã, que já os Apóstolos Pedro e Paulo, nas suas cartas,
significavam como “edifício espiritual”, construído por Deus com as “pedras vivas” que são os
cristãos, sobre o único fundamento que é Jesus Cristo, por sua vez comparado com a “pedra
angular” (cf. 1 Cor 3, 9-11.16-17; 1 Pd 2, 4-8; Ef 2, 20-22). “Irmãos, vós sois edifício de Deus”,
escreve São Paulo e acrescenta: “santo é o templo de Deus, que sois vós” (1 Cor3, 9.17). A
beleza e a harmonia das igrejas, destinadas a prestar louvor a Deus, convida, também nós
seres humanos, limitados e pecadores, a converter-nos para formar um “cosmos”, uma
construção bem ordenada, em estreita comunhão com Jesus, que é o verdadeiro Santo dos
Santos.
O que representa para a liturgia e para a espiritualidade cristã a dedicação de uma Igreja e a
existência mesma, da Igreja, considerando lugar de culto?
O templo sempre foi considerado, entre os judeus, como lugar de uma particular presença de
Deus. No deserto, Deus manifestava-se, na Tenda do encontro, onde Moisés falava com o
Senhor, como se fala com um amigo; nesses instantes, a coluna de nuvem –sinal da presença
divina- descia e detinha-se à entrada da Tenda (Ex 33,7-11). Era o lugar onde estará presente o
meu Nome, o Ser infinito e inefável, para escutar e atender aos seus fiéis. Quando Salomão
construiu o Templo de Jerusalém, pronunciou estas palavras, na festa da sua dedicação: ” É
possível que Deus habite verdadeiramente sobre a Terra? Porque se o céu e os céus dos céus
não te podem conter, quanto menos esta casa que eu edifiquei! Mas, atende, Senhor meu
Deus, à oração do Teu servo e às suas súplicas; ouve o hino e a oração que o teu servo faz,
hoje, na Tua presença, para que os teus olhos estejam abertos, noite e dia, sobre esta casa, da
qual disseste: “O meu nome estará nela”, Israel, em tudo o que te pedirem neste lugar; sim, tu
a ouvirás do lugar da tua morada no céu…” (1Rs 8,27-30).
O templo, ensina São João Paulo II, “é casa de Deus e vossa. Apreciai-o, pois, como lugar de
encontro com o Pai comum” (Homilia, Madri, 3/11/1982). A igreja-edifício representa e
significa a Igreja- assembleia, formada pelas pedras vivas que são os cristãos, consagrados a
Deus pelo Batismo.
As Igrejas são o lugar de reunião dos membros do novo Povo de Deus, que se congregam para
rezar juntos. Mas são sobretudo o lugar em que encontramos Jesus, real e substancialmente
presente na Sagrada Eucaristia; está presente com a sua Divindade e com a sua Santíssima
Humanidade, com o seu Corpo e a sua Alma. “Ali nos vê e nos ouve, e nos socorre como
socorria aqueles que chegavam, necessitados, de todas as cidade e aldeias” (Mc 6,32). Temos,
pois, de ir à igreja com toda a reverência, já que não há nada mais respeitável do que a casa do
Senhor: Que respeito devem inspirarmos as nossas Igrejas, onde se oferece o sacrifício do Céu
e da terra, o Sangue de um Deus feito homem?
Somos sempre conscientes de que Jesus é nosso Hóspede aqui na terra, de que necessita das
nossas atenções? Examinemos hoje se, ao entrarmos numa Igreja, dirigimo-nos
imediatamente a Jesus no Sacrário, se nos comportarmos com a consciência de estarmos num
lugar onde Deus habita de modo particular, se as nossas genuflexões diante de Jesus
Sacramentado são um verdadeiro ato de fé, se nos alegramos sempre que passamos por uma
Igreja, onde Cristo se encontra realmente presente. “Não te alegras quando descobres no Teu
caminho habitual, pelas ruas da cidade, outro Sacrário?” (São Josemaria Escrivá, Caminho,
270). E continuamos os nossos afazeres com mais alegria e paz.
Na oração do Prefácio, a Igreja canta: “Vós quisestes habitar esta casa de oração para nos
tornarmos, pelo auxílio da vossa graça, o templo do Espírito Santo, irradiando o brilho de uma
vida santa. Assim, santificando-a sem cessar, conduzis para a vossa glória a Igreja, Esposa de
Cristo e mãe exultante de inúmeros filhos, simbolizada pelos templos visíveis” (1Cor 3, 16-17).
Possa a celebração de hoje despertar em nós este anseio pela casa do Senhor, fazendo-nos
compreender seu profundo significado, animando-vos a nos encontrar nela no final de uma
semana de trabalho, passada em nossas casas, na escola, na fábrica ou no exercício de
qualquer outra profissão!
A Igreja deve ser o sinal do amor mútuo entre aqueles que partem o mesmo pão. Para quem
não crê ainda, este deveria ser o “chamado” mais forte para entrar na Igreja.
A festa de hoje celebra um Mistério sempre atual: isto é, que Deus quer edificar, no mundo,
um templo espiritual, uma comunidade que o adore em espírito e verdade (Jo 4, 23-24). Mas
esta celebração recorda também a importância dos edifícios materiais, nos quais as
comunidades se reúnem para celebrar o louvor de Deus. Cada comunidade tem, portanto, o
dever de conservar com cuidado os próprios edifícios sagrados, que constituem um precioso
patrimônio religioso e histórico. Invoquemos, então, a intercessão de Maria Santíssima, para
que nos ajude a tornar-nos como ela, “casa de Deus”, templo vivo do seu amor.
Peçamos a Deus que nos dê grande respeito e amor pela sua casa.
Dom José Maria Pereira

