Roteiro Homilético – II Domingo da Páscoa – Ano B

RITOS INICIAIS

 

1 Pedro 2, 2

ANTÍFONA DE ENTRADA: Como crianças recém-nascidas, desejai o leite espiritual, que vos fará crescer e progredir no caminho da salvação. Aleluia.

 

Ou

Esd 2, 36-37

Exultai de alegria, cantai hinos de glória. Dai graças a Deus, que vos chamou ao reino eterno. Aleluia.

 

Diz-se o Glória.

 

Introdução ao espírito da Celebração

 

A concorrência competitiva e o domínio dos mais fortes e dotados sobre os mais débeis e fragilizados são considerados válidos nesta sociedade em que nos movemos, como já era no tempo das primitivas comunidades cristãs.

Ora, essas comunidades, que estavam alicerçadas no serviço recíproco e na partilha dos bens, destruía a ordem dos valores comummente aceites como legítimos e normais. Os cristãos eram, por isso, considerados como cidadãos de outro mundo, pois se apresentavam com duas características inacreditáveis: «tinham um só coração e uma só alma» e «ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas, entre eles, tudo era comum».

Talvez seja isto que nos falta hoje para termos a credibilidade necessária na manifestação da nossa fé em Jesus Cristo ressuscitado.

Perante tal omissão, entremos um pouco dentro de nós próprios e peçamos perdão ao Senhor, a fim de podermos viver mais intensamente esta celebração.

 

ORAÇÃO COLECTA: Deus de eterna misericórdia, que reanimais a fé do vosso povo na celebração anual das festas pascais, aumentai em nós os dons da vossa graça, para compreendermos melhor as riquezas inesgotáveis do Baptismo com que fomos purificados, do Espírito em que fomos renovados e do Sangue com que fomos redimidos. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

 

LITURGIA DA PALAVRA

 

Primeira Leitura

 

Monição: Cristo ressuscitado não se podia ver. Todavia, a força do Espírito recebido inspirava os cristãos a serem diferentes da sociedade onde estavam inseridos. O seu forte testemunho de fraternidade e comunhão demonstrava que a fé na ressurreição superava todas as divisões e medos e lhes trazia a paz.

 

Actos dos Apóstolos 4, 32-35

32A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma; ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas tudo entre eles era comum. 33Os Apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus com grande poder e gozavam todos de grande simpatia. 34Não havia entre eles qualquer necessitado, porque todos os que possuíam terras ou casas vendiam-nas e traziam o produto das vendas, 35que depunham aos pés dos Apóstolos. Distribuía-se então a cada um conforme a sua necessidade.

 

Este trecho é chamado o segundo «relato sumário». O primeiro (Act 2, 42-47) leu-se neste mesmo Domingo do ano A. O terceiro (Act 5, 12-16) lê-se no ano C. Chamam-se relatos sumários por serem uma espécie de bosquejos do estado da primitiva comunidade de Jerusalém, uma descrição um tanto idealizada, generalizando o que de mais positivo e edificante se verificou nos inícios. Todos estes três sumários focam três pontos importantes da vida dos primeiros cristãos, mas este desenvolve o cuidado dos pobres que havia entre eles. O 1º detém-se mais na sua vida religiosa, e o 3º no dom de operar milagres, que tinham os Apóstolos.

32 «Um só coração e uma só alma». Note-se a redundância que confere grande expressividade ao facto. Assim os primeiros cristãos viviam de acordo com as palavras de Jesus na sua oração sacerdotal (Jo17, 11.21-23; cf. Filp 1, 27). «Uma tal união brota espontaneamente duma mesma fé em Jesus e dum mesmo amor pela sua adorável Pessoa» (Renié).

32-34 «Tudo entre eles era comum. Todos… vendiam…» Esta atitude extraordinariamente generosa dos nossos primeiros irmãos de Jerusalém ficou para sempre como um luminoso exemplo de como «compartilhar com os outros é uma atitude cristã fundamental. Os primeiros cristãos puseram em prática espontaneamente o princípio segundo o qual os bens deste mundo são destinados pelo Criador à satisfação das necessidades de todos sem excepção» (Paulo VI). Mas esta atitude cristã nada tem a ver com a colectivização de toda a propriedade privada imposta por um estado totalitário, uma vez que aqui era respeitada a legítima liberdade individual, podendo não se pôr tudo em comum. É por isto mesmo que se louva o gesto de Barnabé, logo a seguir, nos vv. 36-37, e se censura a fraude de Ananias e Safira, que muito bem poderiam não ter vendido o seu campo, ou então ter ficado para si com o produto da venda (cf. Act 5, 4). Daqui se conclui que «todos» não se deve entender à letra, ao ser uma generalização, ou uma hipérbole. Em todos os tempos da vida da Igreja, desde então até aos nossos dias, numerosos grupos de cristãos têm posto em comum os seus bens, renunciando mesmo à sua posse, total ou parcial, imitando assim voluntariamente os primeiros cristãos.

 

Salmo Responsorial

 

Sl 117, 2-4. 16ab-18, 22-24

 

Monição: O salmista convida-nos insistentemente a aclamar, louvar e cantar salmos ao Senhor, pois Ele é extraordinariamente misericordioso e realiza prodígios de firmeza e amor.

 

Refrão:       DAI GRAÇAS AO SENHOR, PORQUE ELE É BOM,

                      PORQUE É ETERNA A SUA MISERICÓRDIA.

 

Ou:                ACLAMAI O SENHOR, PORQUE ELE É BOM:

                      O SEU AMOR É PARA SEMPRE.

 

Ou:                ALELUIA.

 

Diga a casa de Israel:

é eterna a sua misericórdia.

Diga a casa de Aarão:

é eterna a sua misericórdia.

 

Digam os que temem o Senhor:

é eterna a sua misericórdia.

A mão do Senhor fez prodígios,

a mão do Senhor foi magnífica.

 

Não morrerei, mas hei-de viver,

para anunciar as obras do Senhor.

Com dureza me castigou o Senhor,

mas não me deixou morrer.

 

A pedra que os construtores rejeitaram

tornou-se pedra angular.

Tudo isto veio do Senhor:

é admirável aos nossos olhos.

Este é o dia que o Senhor fez:

exultemos e cantemos de alegria.

 

Segunda Leitura

 

Monição: Nesta leitura é-nos recordado que as obras de amor para com todos nunca se podem separar da vida. Elas são o sinal da verdadeira fé.

 

1 São João 5, 1-6

Caríssimos: 1Quem acredita que Jesus é o Messias, nasceu de Deus, e quem ama Aquele que gerou ama também Aquele que nasceu d’Ele. 2Nós sabemos que amamos os filhos de Deus quando amamos a Deus e cumprimos os seus mandamentos, 3porque o amor de Deus consiste em guardar os seus mandamentos. E os seus mandamentos não são pesados, 4porque todo o que nasceu de Deus vence o mundo. Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. 5Quem é o vencedor do mundo senão aquele que acredita que Jesus é o Filho de Deus? 6Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo; não só com a água, mas com a água e o sangue. É o Espírito que dá testemunho, porque o Espírito é a verdade.

 

Nos domingos pascais do Ano B, a partir deste 2º Domingo, vamos ter como 2ª leitura trechos respigados da 1ª Carta de S. João (no ano A temos trechos de 1 Pe; no ano C, do Apoc). O facto de hoje não começarmos pelo início, mas pela parte final da epístola, só se explica pela carácter baptismal deste Domingo, que se chamou In albis, numa alusão às vestes brancas do Baptismo, e Quasi-modo pelas primeiras palavras latinas do célebre texto baptismal da Prima Petri adoptado como cântico de entrada da Missa (1 Pe 2, 2). No breve texto da leitura de hoje aparece por três vezes a palavra «água» (v. 6) e três vezes «nascer de Deus» (vv. 2a.2b.4), em que se pode ver uma alusão ao Baptismo. É interessante notar neste trecho o nexo entre a fé e o amor, e entre o amor de Deus e o dos irmãos, que, pelo Baptismo, se tornaram «filhos de Deus» (vv. 1-2).

1 «Quem ama Aquele que gerou ama também Aquele que nasceu d’Ele». Há duas possibilidades de entender o texto original. A versão litúrgica, pela utilização das maiúsculas, vê-se que prefere o sentido de que quem ama o Pai ama também o Filho (um sentido trinitário); mas o contexto próximo do amor fraterno levou-nos a preferir outra tradução: «todo aquele que ama Quem o gerou ama também quem por Ele foi gerado» (cf. a nossa tradução na Bíblia Sagrada da Difusora Bíblica). Assim, o amor aos irmãos é proposto como uma consequência da filiação divina, a derivar do amor a Deus (cf. 1 Jo 2, 29 – 3, 2; 4, 7.15; 1 Pe 1, 22-23).

3 «O amor de Deus consiste em guardar os seus mandamentos». O ensino de Jesus no Evangelho é neste sentido: Mt 7, 21; 12, 50; Jo 14, 15.21; 15, 14. «E os seus mandamentos não são pesados» é uma expressão que faz lembrar Mt 11, 30: «o meu jugo é suave e a minha carga é leve».

6 «Veio com água e com sangue»: esta insistência faz pensar na intenção de refutar os gnósticos, concretamente a heresia de Cerinto, para quem o Filho de Deus tomou posse de Jesus no Baptismo – a «água» –, e o abandonou ao chegar à sua Paixão – o «sangue». Muitos autores, seguindo os Santos Padres, vêem na referência à água e ao sangue uma alusão aos Sacramentos do Baptismo (cf. Jo 3, 5), em que se recebe o Espírito Santo (cf. Jo 7, 37-39) e da Eucaristia (cf. Jo 6, 53.55-56), figurados, por sua vez, na água e no sangue que brotaram do lado aberto de Cristo na Cruz (Jo 19, 33-35), o Novo Adão, de cujo lado saiu a Igreja, qual nova Eva. O versículo 7 (que não aparece na leitura de hoje) diz: «São três os que dão testemunho, o Espírito, a água e o sangue», o que levou os Padres a verem nestes três testemunhosunânimes um símbolo e um reflexo da SS. Trindade; daqui resultou que, em muitos manuscritos da Vulgata, o texto foi transcrito de diversas maneiras, sendo a mais corrente: «Três são os que dão testemunho no Céu: o Pai, o Verbo e o Espírito Santo, e estes três são um só». Este acrescento (o chamado comma ioanneum, que foi objecto de tanta discussão inútil) veio a entrar para o texto oficial da Igreja, mas, embora a edição da Vulgata sisto-clementina o aceite, a Nova Vulgata já não o mantém.

 

Aclamação ao Evangelho

 

Jo 20, 29

 

Monição: A evidência possui a prova irrefutável dum facto. A felicidade daqueles que acreditam sem terem visto é a fé genuína, a única realmente pura.

 

ALELUIA

 

Disse o Senhor a Tomé: «Porque Me viste, acreditaste;

felizes os que acreditam sem terem visto».

 

 

Evangelho

 

São João 20, 19-31

19Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, colocou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco».20Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor. 21Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós». 22Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo: 23àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes serão retidos». 24Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus. 25Disseram-lhe os outros discípulos: «Vimos o Senhor». Mas ele respondeu-lhes: «Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado, não acreditarei». 26Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez em casa, e Tomé com eles. Veio Jesus, estando as portas fechadas, apresentou-Se no meio deles e disse: «A paz esteja convosco». 27Depois disse a Tomé: «Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima a tua mão e mete-a no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente». 28Tomé respondeu-Lhe: «Meu Senhor e meu Deus!» 29Disse-lhe Jesus: «Porque Me viste acreditaste: felizes os que acreditam sem terem visto». 30Muitos outros milagres fez Jesus na presença dos seus discípulos, que não estão escritos neste livro. 31Estes, porém, foram escritos para acreditardes que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, e para que, acreditando, tenhais a vida em seu nome.

 

Neste breve relato pode ver-se como Jesus cumpriu a suas promessas que constam dos discursos de despedida: voltarei a vós (14, 18) – pôs-se no meio deles (v. 19); um pouco mais e ver-Me-eis (16, 16) –encheram-se de alegria por verem o Senhor (v. 20); Eu vos enviarei o Paráclito (16, 7) – recebei o Espírito Santo (v. 22); ver também Jo 14, 12 e 20, 17.

19 «A paz esteja convosco!» Não se trata duma mera saudação, a mais corrente entre os judeus, mesmo ainda hoje. Esta insistência joanina na sudação do Senhor ressuscitado (vv. 19.21.26) é muito expressiva; com efeito nunca os Evangelhos registam tal saudação, mas só agora, quando Jesus, com a sua Morte e Ressurreição, acabava de nos garantir a paz, a paz com Deus, origem e alicerce de toda a verdadeira paz (cf. Jo 14, 27; Rom 5, 1; Ef 2, 14; Col 1, 20).

20 O mostrar das mãos e do peito acentua a continuidade entre o Jesus crucificado e o Senhor glorioso (cf. Hebr 2, 18); a sua presença, que transcende a dimensão espácio-temporal (cf. vv. 19.26), é uma realidade que os enche de paz (vv. 19.21.26; cf. Jo 14, 27; 16, 33; Rom 5, 1; Col 1, 20) e de alegria (v. 20; cf. Jo 15, 11; 16, 20-24; 17, 13), conforme Jesus prometera. «Ficaram cheios de alegria» é uma observação que confere ao relato uma grande credibilidade; com efeito, naqueles discípulos espavoridos (v. 19), desiludidos e estonteados, surge uma vivíssima reacção de alegria, ao verem o Senhor. Ao contrário do que era de esperar, não se verifica aqui o esquema habitual das visões divinas, as teofanias do A. T., em que sempre há uma reacção de temor e de perturbação. A grande alegria dos Apóstolos procede da certeza da vitória de Jesus sobre a morte e também de verem como Jesus reatava com eles a intimidade anterior, sem recriminar a fraqueza da sua fé e a vergonha da sua deslealdade.

22 «Soprou sobre eles… Recebei o Espírito Santo». Este soprar de Jesus não é ainda «o vento impetuoso» do dia de Pentecostes; é um sinal visível do dom invisível do Espírito (em grego é a mesma palavra que também significa «sopro»). Aqui, tem por efeito conferir-lhes o poder de perdoar os pecados, poder dado só aos Apóstolos (e seus sucessores no sacerdócio da Nova Aliança), ao passo que no dia do Pentecostes é dado o Espírito Santo também a outros discípulos reunidos com Maria no Cenáculo (cf. Act 1, 14; 2, 1), iluminando-os e fortalecendo-os com carismas extraordinários em ordem ao cumprimento da missão de que estavam incumbidos.

23 «A quem perdoardes…» A Igreja viu nestas palavras a instituição do Sacramento da Reconciliação, que é fonte de paz e alegria, e definiu mesmo o seu sentido literal; de facto Jesus diz: «a quem perdoardes os pecados», e não: «a quem pregardes o perdão dos pecados» (segundo entendeu a reforma protestante). A expressão é muito forte, pois deve-se ter em conta o uso judaico da voz passiva para evitar pronunciar o nome inefável de Deus (passivum divinum); sendo assim, dizer ficarão perdoados corresponde a «Deus perdoará» e «ficarão retidos» equivale a «Deus reterá», isto é, não perdoará (cf. Mt 16, 19; 18, 18; 2 Cor 5, 18-19). Aqui se funda o ensino do Concílio de Trento ao falar da necessidade de confessar todos os pecados graves cometidos depois do Baptismo, uma doutrina que, já depois do Vaticano II, o magistério de Paulo VI reafirma: «a doutrina do Concílio de Trento deve ser firmemente mantida e aplicada fielmente na prática»; por isso, os fiéis que, em perigo de morte ou em caso de grave necessidade, tenham recebido legitimamente a absolvição comunitária ou colectiva de pecados graves ficam com a grave obrigação de os confessar dentro de um ano (Normas Pastorais da Congregação para a Doutrina da Fé, 16-VI-1972); também o Catecismo da Igreja Católica, nº 1497, afirma: «a confissão individual e integral dos pecados graves, seguida da absolvição, continua a ser o único meio ordinário para a reconciliação com Deus e com a Igreja»; cf. tb. o Motu proprio de João Paulo II, Misericordia Dei (7.4.2002) e Código de Direito Canónico (nº 960.).

24 «Tomé», nome aramaico Tomá significa «gémeo»; em grego, dídymos.

28 «Meu Senhor e meu Deus!» É da boca do discípulo incrédulo que sai a mais elevada profissão de fé explícita na divindade de Cristo, a qual engloba todo o Evangelho numa unidade coerente.

29 «Felizes os que acreditam sem terem visto». Para a generalidade dos fiéis, a fé (dom de Deus) não tem mais apoio humano verificável do que o testemunho grandemente crível da pregação apostólica e da Igreja através dos séculos (cf. Jo 17, 20). Para crer não precisamos de milagres, basta a graça, que Deus nunca nega a quem busca a verdade com humildade e sinceridade de coração. O facto de as coisas da fé não serem evidentes, nem uma mera descoberta da razão, só confere mérito à atitude do crente, que crê confiando em Deus, que na sua Revelação não se engana nem pode enganar-nos. Por isso, Jesus proclama-nos «felizes», ao submetermos o nosso pensamento e a nossa vontade a Deus na entrega que o acto de fé implica. Como Tomé, também nós temos garantias de credibilidade suficientes para aceitar a Boa Nova de Jesus: as nossas escusas para não crer são escusas culpáveis, escusas de mau pagador. Também as estrelas não deixam de existir pelo facto de os cegos não as verem ou de o céu estar nublado.

30-31 Temos aqui a primeira conclusão do Evangelho de S. João, que nos deixa ver o objectivo que o Evangelista se propôs: fazer progredir na fé e na vida cristã os fiéis, sem que se possa excluir também uma intenção de trazer à fé os não crentes. Este Evangelho foi escrito para crermos que «Jesus é o Messias, o Filho de Deus». Note-se que a fé não é uma mera disposição interior de busca, aposta, ou caminhada, sem uma base doutrinal, implica um conteúdo de ensino (cf. Rom 6, 17), pois exige que se aceitem «verdades» como esta, a saber, que Jesus é o Filho de Deus, e Filho, não num sentido genérico, humano ou messiânico, pois é o «Filho Unigénito que está no seio do Pai» (Jo 1, 18), verdadeiro Deus, segundo a confissão de S. Tomé: «Meu Senhor e meu Deus» (v. 28; cf. Jo 1, 1; Rom 9, 5). Note-se que há quem veja o Evangelho segundo S. João contido dentro de uma grande inclusão, que põe em evidência a divindade de Cristo: Jo 1, 1 (O Verbo era Deus) e Jo 20, 28 (meu Senhor e meu Deus), tendo como centro e clímax a afirmação de Jesus: Eu e o Pai somos Um (10, 30).

 

Sugestões para a homilia

 

1 – A dificuldade em acreditar

2 – A comunidade, sinal de fé

3 – Testemunho de vida

 

1- A dificuldade em acreditar

O Evangelho deste domingo foi escrito especialmente para as comunidades cristãs que já não tinham conhecido nenhum dos doze apóstolos. Inseridos numa sociedade altamente competitiva, tinham dificuldade em acreditar na ressurreição de Jesus. Queriam, como muitos de nós o desejaríamos ainda hoje, ver, tocar, verificar se efectivamente o Senhor ressuscitara. Interrogavam-se se haveria provas de que Ele estava realmente vivo e, se assim era, por que razão não tornara a aparecer.

João quis dizer aos cristãos da sua comunidade (e a nós) que o Ressuscitado possui uma vida cuja natureza escapa aos nossos sentidos, que não se pode tocar com as mãos nem se pode observar com os olhos. Só pode ser objecto da fé. Isto é válido mesmo para os apóstolos que tiveram a felicidade de fazer uma experiência única do convívio com o Ressuscitado. Todos os apóstolos tiveram os seus instantes de dúvida, e não só Tomé. O seu caminho da fé foi demorado e difícil, embora Jesus lhes tivesse dado tantos sinais para provar que estava vivo. Tomé é o símbolo destas dificuldades vividas por todos.

Não se pode ter fé naquilo que se vê. Não se podem ter provas científicas da ressurreição. Se alguém quer ver, tocar, reconhecer, deve renunciar à fé. Quem possui a segurança da certeza, tem a prova incontestável dum facto, mas não a fé. Nós pensamos: «eles foram felizes porque viram». Mas Jesus diz que felizes são os que não viram, pois a sua fé é mais autêntica, mais límpida, ou melhor, é a única fé pura.

Perante a proposta do Evangelho, cada um de nós é chamado a transmitir a sua aceitação de fé em Jesus Cristo Ressuscitado, mas também a pode rejeitar, pois não existem outras provas além da própria Palavra.

É na comunidade que nos é possível repetir a experiência que os apóstolos fizeram no dia de Páscoa.

 

2 – A comunidade, sinal de fé

Não foi por acaso que as duas manifestações de Cristo aos apóstolos ocorreram ao domingo; que a experiência do Ressuscitado acontece com os mesmos; que o Senhor se mostra com as mesmas palavras: «A paz esteja convosco!»; e que em ambos os momentos mostra os vestígios da paixão.

É claramente o que se dá hoje no «dia do Senhor», em que a comunidade é convidada a celebrar a Eucaristia. Pela boca do celebrante, saúda os presentes: «A paz esteja convosco», e nós respondemos: «Ele está no meio de nós». É nesse instante que Ele Se revela vivo à comunidade.

Quem está ausente destes encontros, como Tomé, não pode fazer a experiência do Ressuscitado, não pode ouvir a sua saudação e a sua Palavra, não pode receber a sua paz e o seu perdão, experimentar a sua alegria, receber o seu Espírito. Quem, no dia do Senhor, fica em casa, mesmo que seja para rezar sozinho, pode fazer a experiência de Deus, mas não a do Ressuscitado, pois este torna-se oferenda no lugar onde se reúne a comunidade.

Tomé somente conseguiu fazer a sua profissão de fé no Senhor quando estava em comunidade de irmãos. É a possibilidade que nos é dada também a nós «cada oito dias». E é nessa comunidade, e através dela, que poderemos dar testemunho de vida.

 

3 – Testemunho de vida

Na e com a comunidade seremos capazes de viver a fé demonstrando a ressurreição de Cristo. Se a comunidade estiver cimentada nas duas características aludidas na primeira leitura, isto é, «tendo um só coração e uma só alma» e «pondo tudo em comum» não sendo inspirada pelo egoísmo, mas sim pela lei do amor, da bondade, da oferta de si, então seremos capazes de atestar que o Espírito de Cristo ressuscitado também nos foi comunicado a nós.

Quem armazena só para si e para a própria família, quem quer engrandecer sozinho, mesmo que vá sempre à igreja, não passa a notícia de que Jesus ressuscitou.

O sinal concreto da nossa fé é este verdadeiro testemunho de amor, de ajuda mútua, de fraternidade. O fundamento mais consistente de que todos somos filhos do mesmo Pai, como nos afirma a segunda leitura: são as obras de amor para com todos aqueles que são gerados por Deus, ou seja, todos os irmãos.

A verdadeira fé nunca se pode separar da vida.

 

Fala o Santo Padre

Neste domingo o Evangelho de João narra que Jesus apareceu aos discípulos, reunidos com as portas fechadas no Cenáculo, na noite do «primeiro dia depois do sábado» (Jo 20, 19), e que se lhes mostrou de novo no mesmo lugar «oito dias depois» (Jo 20, 26). Desde o início, portanto, a comunidade cristã começou a viver um ritmo semanal, marcado pelo encontro com o Senhor ressuscitado. É quanto ressalta também a Constituição do Concílio Vaticano II sobre a liturgia, afirmando: «Por tradição apostólica, que nasceu do próprio dia da Ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o mistério pascal todos os oito dias, no dia em que bem se denomina dia do Senhor ou domingo» (Sacrosanctum Concilium, 106).

Recorda ainda o Evangelista que nas duas aparições no dia da Ressurreição e oito dias depois o Senhor Jesus mostrou aos discípulos os sinais da crucifixão, bem visíveis e tangíveis também no seu corpo glorioso (cf. Jo 20, 20.27). Aquelas sagradas chagas, nas mãos, nos pés e no lado, são fonte inexaurível de fé, de esperança e de amor da qual todos podem haurir, especialmente as almas mais sequiosas da Divina Misericórdia. […]

Bento XVI, Regina Caeli, 23 de Abril de 2006

 

 

 

LITURGIA EUCARÍSTICA

 

Monição do ofertório

 

Os dons da terra que vamos consagrar sobre o altar, sejam penhor de que neles oferecemos, juntamente com Cristo ressuscitado, toda a nossa vida, a fim de que consigamos criar uma comunidade inspirada pela lei do amor, da generosidade e da união fraterna.

 

ORAÇÃO SOBRE AS OBLATAS: Aceitai benignamente, Senhor, as ofertas do vosso povo [e dos vossos novos filhos], de modo que, renovados pela profissão da fé e pelo Baptismo, mereçamos alcançar a bem-aventurança eterna. Por Nosso Senhor.

 

Prefácio pascal I [mas com maior solenidade neste dia]: p. 469 [602-714]

 

No Cânone Romano dizem-se o Communicantes (Em comunhão com toda a Igreja) e o Hanc igitur (Aceitai benignamente, Senhor) próprios. Nas Orações Eucarísticas II e III fazem-se também as comemorações próprias.

 

SANTO

 

Abraço da paz

 

Monição: Sacudidos pela novidade da fé em Cristo Ressuscitado, consciencializemo-nos de que há muitos serviços a fazer e muitas funções a desempenhar na nossa comunidade. Tenhamos, pois, a coragem de seguir os passos das primitivas comunidades cristãs, para auxiliarmos mais e melhor todos os nossos irmãos, a fim de termos paz interior e a podermos comunicar a todos os homens.

 

Monição da Comunhão

 

Através da comunhão com Cristo ressuscitado, ajudai-nos, Senhor, a aumentarmos a coragem de concretizar o serviço recíproco e a partilha dos bens, a fim de que a nossa fé na ressurreição faça superar todas as divisões e credibilize a nossa acção no meio deste mundo, em que domina a competição e o desejo de domínio sobre os outros.

 

 

ANTÍFONA DA COMUNHÃO: Disse Jesus a Tomé: Com a tua mão reconhece o lugar dos cravos. Não sejas incrédulo, mas fiel. Aleluia.

 

CÂNTICO DE ACÇÃO DE GRAÇAS: BENDITA E LOUVADA SEJA, M. Simões, NRMS 41

 

ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO: Concedei, Deus todo-poderoso, que a força do sacramento pascal que recebemos permaneça sempre em nossas almas. Por Nosso Senhor.

 

 

RITOS FINAIS

 

Monição final

 

Servir, amar, ensinar, preferir, visitar, acariciar, comungar, escolher, defender, advertir, partilhar ter um só coração e uma só alma e saber conviver com os outros, hão-de ser as manifestações concretas de que conseguimos testemunhar a nossa fé em Cristo ressuscitado.

 

 

 

HOMILIAS FERIAIS

 

2ª SEMANA

 

2ª Feira, 16-IV: Novo nascimento e vida de oração.

Act 4, 23-31 / Jo 3, 1-8

Disse Jesus a Nicodemos: Não te admires de eu te ter dito: Vós tendes de nascer de novo.

Jesus fala de um novo nascimento: pela água e pelo Espírito Santo (cf Ev). Com efeito, o baptizado recebe uma nova vida – a vida sobrenatural –, é filho adoptivo de Deus, participa da sua natureza divina pela graça, passa a ser templo do Espírito Santo.

Este novo nascimento requer igualmente uma vida de oração: «Depois de terem rezado…todos ficaram cheios do Espírito Santo». A oração dá-nos uma nova perspectiva da vida corrente, pois começamos a ver os acontecimentos e as pessoas como as vê Deus, quem nos comunica as luzes convenientes.

 

3ª Feira, 17-IV: Um só coração e uma só alma.

Act 4, 32-37 / Jo 3, 7-15

A multidão dos que tinham abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma.

Precisamos aproveitar o Tempo Pascal, apoiados nas palavras de Jesus a Nicodemos, para um novo nascimento: «Vós tendes que nascer de novo» (Ev). Esta renovação pode consistir em imitar o modo de vida dos primeiros cristãos: «com um só coração e com uma só alma» (Leit).

Este ideal de comunhão há-de levar a que, em todas as famílias, haja uma verdadeira partilha de bens espirituais e materiais (cf Leit), uma entreajuda entre todos, evitando os pequenos conflitos que são objecto de discórdia.

 

4ª Feira, 18-IV: As palavras de vida da Bíblia.

Act 5, 17-26 / Jo 3, 16-21

Deus amou de tal modo o mundo que entregou o seu Filho único, para que todo o homem que acredita n’Ele não se perca.

O Filho de Deus encarnou para que nos recordássemos do amor que Deus tem por cada um de nós (cf Ev). Não podemos esquecer estes ensinamentos que constituem um autêntico tesouro, uma fonte de conselhos e exemplos para os diferentes momentos da nossa vida.

Também precisamos anunciar a todos as palavras de vida, ensinadas por Cristo, como disse o Anjo aos Apóstolos (cf Leit). Na leitura da Bíblia encontraremos igualmente as palavras adequadas à missão que temos de tornar a sociedade mais justa.

 

5ª Feira, 19-IV: A secularização da cultura.

Act 5, 27-33 /Jo 3, 31-36

(O sumo sacerdote): Já vos demos a ordem formal de não ensinar em nome de Jesus. E vós enchestes Jerusalém da nova doutrina.

Também nos nossos tempos a cultura secularizada pretende impor-nos o mesmo silêncio. Quer construir uma ordem temporal sem Deus, que é o seu fundamento. E assim se cai nos maiores ataques à dignidade humana: o aborto, a eutanásia, o acasalamento de pessoas do mesmo sexo: «Quem se recusa a crer no Filho, não terá a vida» (Ev).

A nossa reacção há-de ser como a dos Apóstolos: «Deve obedecer-se antes a Deus do que aos homens» (Leit). Em todas as situações não podemos prescindir da nossa fé: no mundo do trabalho, dos negócios, da família, da vida, da educação.

 

6ªFeira, 20-IV:Alimentação saudável.

Act 5, 34-42 / Jo 6, 1-15

Então Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos convivas. E fez o mesmo com os peixes.

Jesus ajuda os homens a matar a fome (cf Ev), mas a sua missão fundamental é a libertação do pecado e o fornecimento de alimentos adequados para a alma. Quando pedimos «o pão-nosso de cada dia nos dai hoje» (Pai-nosso) referimo-nos às necessidades materiais e também ao pão eucarístico.

É bom que o nosso corpo esteja saudável, mas o melhor é que a alma esteja de boa saúde espiritual. Assim se compreende que os Apóstolos se tivessem alegrado de ter sido açoitados por causa do nome de Jesus (cf Leit), pois cumpriam a vontade de Deus.

 

Sábado, 21-IV: S. Marcos: A transmissão da Boa Nova.

Ped 5, 5-14 / Mc 16, 15-20

Jesus apareceu aos onze Apóstolos e disse-lhes: ide a todo o mundo e proclamai a Boa Nova.

S. Marcos acompanhou S. Paulo na sua primeira viagem apostólica e esteve a seu lado na hora da morte. Foi igualmente discípulo de S. Pedro em Roma (cf Leit), e o seu Evangelho é uma reprodução fiel dos ensinamentos deste Apóstolo.

O Senhor confiou-a a S. Marcos, de um modo especial (cf Oração), e também a todos nós. Para isso precisamos escutá-la, assimilá-la, meditando-a no nosso coração e, depois, comunicá-la aos outros com toda a fidelidade, como fez S. Marcos com o que aprendeu junto de S. Pedro e S. Paulo.

 

 

 

 

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Celebração e Homilia:          ANTÓNIO E. PORTELA

Nota Exegética:                     GERALDO MORUJÃO

Homilias Feriais:                   NUNO ROMÃO

Sugestão Musical:                 DUARTE NUNO ROCHA

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