Homilia de Mons. José Maria Pereira – XIV Domingo do Tempo Comum – Ano A

O convite de Jesus!

No Evangelho de hoje, o Senhor Jesus repete-nos aquelas palavras que conhecemos tão bem, mas que nos comovem sempre: “Vinde a mim, todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mt 11, 28-30). Quando Jesus percorria os caminhos da Galileia, anunciando o Reino de Deus e curando os doentes, sentia compaixão pelas multidões, porque estavam cansadas e oprimidas “como ovelhas sem pastor” (Mt 9, 35-36).  Aquele olhar de Jesus parece alargar-se até hoje, até ao nosso mundo. Também hoje olha para tanta gente oprimida por condições de vida difíceis, mas também desprovida de pontos de referência válidos para encontrar um sentido e uma meta para a existência, até doentes de depressão. O olhar de Cristo pousa sobre estas pessoas, aliás, sobre cada um destes filhos do Pai que está nos Céus: “Vinde a mim, vós todos… ” O Senhor chama para Si todos os homens, pois andamos sob o peso das nossas fadigas, lutas e tribulações. A história das almas mostra a verdade destas palavras de Jesus. Só o Evangelho apaga a sede de verdade e de justiça que desejam os corações sinceros. Só Nosso Senhor, o Mestre – e aqueles a quem Ele dá o Seu poder –, pode apaziguar o pecador ao dizer-lhe “ coragem, filho, os teus pecados estão perdoados! ” (Mt 9, 2). Neste sentido ensina São Paulo Vl: “Jesus diz agora e sempre: ‘Vinde a mim todos os que andais afadigados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei’. Efetivamente Jesus está numa atitude de convite, de conhecimento e de compaixão por nós; mais ainda, de oferecimento, de promessa, de amizade, de bondade; de remédio para os nossos males, de confortador, e ainda mais, de alimento, de pão, de fonte de energia e de vida” (Homilia Corpus Christi).

“Vinde a mim”: O Mestre dirige-Se às multidões que O seguem, “cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor” (Mt 9, 36). Os fariseus sobrecarregavam-nas com minuciosas práticas insuportáveis (At 15, 10), que em troca não lhes davam a paz do coração. Pelo contrário, Jesus fala àquelas gentes e também a nós do Seu jugo e da Sua carga: “Qualquer outra carga te oprime e esmaga, mas a carga de Cristo alivia-te o peso. Outra carga qualquer tem peso, mas a de Cristo tem asas. Se a um pássaro lhe tiras as asas, parece que o alivias do peso, mas quanto mais lhe tires este peso, tanto mais o prendes à terra. Vês no solo aquele que quiseste aliviar de um peso; restitui-lhe o peso das suas asas e verás como voa” (Santo Agostinho, Sermão 126). Com um pouco de experiência na intimidade pessoal com o Senhor, compreendemos que nos diga que “o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”. “Como se dissesse: todos os que andais atormentados, aflitos e carregados com a carga dos vossos cuidados e apetites, saí deles, vindo a Mim, e Eu vos recrearei e achareis para as vossas almas o descanso que vos tiram os vossos apetites” (Subida ao Monte Carmelo, Livro l, Cap. 7, 4).

Jesus promete dar a todos “alívio”, mas sob uma condição: “Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração”. O que é este “jugo”, que em vez de pesar alivia, e em vez de esmagar conforta? O “jugo” de Cristo é a lei do amor, é o seu Mandamento, que Ele deixou aos seus discípulos (Jo 13, 34; 15, 12). O verdadeiro remédio para as feridas da humanidade, quer materiais, como a fome e as injustiças, quer psicológicas e morais causadas por um falso bem-estar, é uma regra de vida baseada no amor fraterno, que tem a sua fonte no amor de Deus. Por isso é preciso abandonar o caminho da arrogância, da violência utilizada para obter posições de poder sempre maiores, para garantir o sucesso a qualquer preço. Esse verdadeiro remédio está em aproveitar o Sacramento da Confissão, em que, através do padre, Jesus perdoa nossos pecados, tira o grande peso da culpa de nossas ofensas e nos dá graças preciosas para sermos mais felizes. Por isso é chamado “Sacramento da paz e da alegria”.

Ao lado de Cristo, todas as fadigas se tornam amáveis, tudo o que poderia ser custoso no cumprimento da vontade de Deus se suaviza. O sacrifício, quando se está ao lado de Cristo, não é áspero e duro, mas amável. Ele assumiu as nossas dores e os nossos fardos mais pesados. O Evangelho é uma contínua prova da sua preocupação por todos: “Ele deixou-nos por toda a parte exemplos da sua misericórdia”, escreve São Gregório Magno. Ressuscita os mortos, cura os cegos, os leprosos, os surdos-mudos, liberta os endemoninhados…Por vezes, nem sequer espera que lhe tragam o doente, mas diz: Eu irei e o curarei: Mesmo no momento da morte, preocupa-se com os que estão ao seu lado. E ali entrega-se com amor, como propiciação pelos nossos pecados. E não só pelos nossos, mas também pelos de todo mundo.

Devemos imitar o Senhor: não só evitando lançar preocupações desnecessárias sobre os outros, mas ajudando-os a enfrentar as que têm.

Temos de libertar os outros daquilo que lhes pesa, como Cristo faria se estivesse no nosso lugar.

Ao mesmo tempo, podemos e devemos pensar nesses aspectos em que, muitas vezes sem termos plena consciência disso, contribuímos para tornar um pouco mais pesada e menos grata a vida dos outros:  pelos nossos juízos precipitados, pela crítica negativa, pela indiferença ou falta de consideração, pela palavra que magoa.

Peçamos ao Senhor, na nossa oração pessoal, a ajuda da sua graça para sentirmos uma compaixão eficaz por aqueles que sofrem o mal incomensurável de estarem enredados no pecado. Peçamos-lhe a graça de entender que o apostolado da Confissão é a maior obra de todas as obras de misericórdias, pois é possibilitar que Deus derrame o seu perdão generosíssimo sobre os que se afastaram da casa paterna. Que enorme fardo retiramos dos ombros de quem estava oprimido pelo pecado e se aproxima da Confissão! Que grande alívio e que Paz!
Não encontraremos caminho mais seguro para seguirmos o Senhor e para encontrarmos a nossa própria felicidade do que a preocupação sincera por libertar ou aliviar do seu lastro os que  caminham  cansados e aflitos, pois Deus dispôs as coisas “para que aprendamos a levar as cargas uns dos outros; porque não há ninguém sem defeito, ninguém sem carga, ninguém que se baste a si próprio, nem que seja suficientemente sábio para si” (T. Kempis, Imitação de Cristo, I,16). Todos precisamos uns dos outros. A convivência diária requer essas ajudas mútuas, sem as quais dificilmente poderíamos ir para a frente.

E se alguma vez nós mesmos nos vemos a braços com um fardo excessivamente pesado para as nossas forças, não deixemos de ouvir as palavras do Senhor: Vinde a mim. Só Ele restaura as forças, só Ele sacia a sede. “Jesus diz agora e sempre: Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Efetivamente, Jesus encontra-se numa atitude de convite, de promessa, de amizade, de bondade, de remédio para os nossos males, de conforto e, sobretudo, de pão, de fonte de energia e de vida” (São Paulo VI, Homilia, 12/06/1977). Cristo é o nosso descanso!

O segredo é a oração. Quando, por vezes, na vida, nos sentimos esmagados e não sabemos a quem mais recorrer, temos que voltar-nos decididamente para o Sacrário, onde nos espera o Amigo que nunca atraiçoa nem decepciona, e que, nesse colóquio   sem palavras, nos anima, nos dá critério e nos robustece para a luta.

Quantas preocupações e fardos aparentemente insuportáveis se desfazem à luz trêmula da lamparina de um Sacrário!

Falando sobre a oração, sobre as visitas de adoração a Cristo presente sob as espécies eucarísticas, ensinou São João Paulo ll: “É bom demorar- se com Ele e, inclinado sobre o seu peito como o discípulo predileto (Jo 13,25), deixar-se tocar pelo amor infinito do seu coração. Se atualmente o cristianismo se deve caracterizar sobretudo pela “arte da oração”, como não sentir de novo a necessidade de permanecer longamente, em diálogo espiritual, adoração silenciosa, atitude de amor, diante de Cristo presente no Santíssimo Sacramento? Quantas vezes, meus queridos irmãos e irmãs, fiz esta experiência, recebendo dela força, consolação, apoio! Escrevia Santo Afonso Maria de Ligório: “A devoção de adorar Jesus sacramentado é, depois dos sacramentos, a primeira de todas as devoções, a mais agradável a Deus e a mais útil para nós”. A Eucaristia é um tesouro inestimável: não só a sua celebração, mas também o permanecer diante dela fora da Missa permite – nos beber na própria fonte da graça. Uma comunidade cristã que queira contemplar melhor o rosto de Cristo, segundo o espírito que sugeri nas cartas apostólicas Novo Millennio Ineunte e Rosarium Virginis Mariae, não pode deixar de desenvolver também este aspecto do culto eucarístico, no qual perduram e se multiplicam os frutos da comunhão do corpo e sangue do Senhor” (Carta Encíclica Ecclesia de Eucharistia, João Paulo ll, 25).

Ainda, em clima de oração: fazer uma leitura diária do Evangelho, do Catecismo e de algum livro de espiritualidade; falar com Deus na oração; isso traz luz, paz e conforto; pouco a pouco se perceberá a vida a partir de Deus.

Muitas vezes encontramos muita miséria humana: quantos problemas, quantos sofrimentos, quanta desilusão e quanto amor negado!

Às vezes há problemas que não têm solução, há dor que nenhum analgésico cura, há escuridão onde a luz não penetra! A todos, sem exceção, Jesus convida: “Vinde a mim todos vós que estais cansados e fatigados, e Eu vos darei descanso”. Só Ele poderá aliviar o peso de nossos sofrimentos! Que consolo ouvir o convite de Nosso Senhor! Quando nos sentirmos cansados ou esgotados, em crise, em vez de desanimar, procuremos Jesus. Seremos acolhidos e encontraremos alívio, consolo e força. Quando procurarmos alívio e descanso nEle, diremos como os santos as sábias palavras de São Paulo: “tudo posso naquele que me fortalece” (Fl 4,13).

Que a Virgem Maria nos ajude a “aprender” de Jesus a verdadeira humildade, a carregar com decisão o seu jugo leve, para experimentar a paz interior e tornarmo-nos, por nossa vez, capazes de confortar os irmãos e as irmãs que percorrem com fadiga o caminho da vida.

Mons. José Maria Pereira

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