Homilia do Padre Françoá Costa da Missa da Noite do Natal | Ano C

Jesus nasceu no ano 753 desde a Fundação de Roma

Missa da Noite do Natal – C – Is 9,1-6; Sl 95; Tt 2,11-14; Lc 2,1-14

O Evangelho afirma categoricamente: “Enquanto lá estavam, completaram-se os dias para o parto, e ela deu à luz seu filho primogênito, envolveu-o com faixas e reclinou-o numa manjedoura” (Lc 2,6-7). O primeiro nascimento do Filho de Deus é eterno, escondido no silêncio comunicativo de Deus; o segundo é temporal, é o que nós celebramos no Natal: o Filho de Deus, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, ao assumir carne humana nas entranhas puríssimas da Virgem Maria, depois de algum tempo, nasceu no tempo. Ele é Jesus Cristo, o ungido de Deus que é Deus conosco e que veio para salvar-nos, para estar conosco, para ser nosso amigo. Bento XVI, no seu livro “Luz do mundo”, é interrogado por Peter Seewald se ele reza. E o Papa lhe responde: “a verdade é que eu tenho uma antiga amizade com Jesus”. A resposta parece inocente, mas expressa a finalidade da encarnação: reconquistar aquela amizade que existia no paraíso.

A última vez que o ser humano escutara os passos do Senhor “que passeava no jardim” fora naquela tarde na qual foi expulso de sua presença (cf. Gn 3,8). O ser humano pode, novamente, escutar os passos de Deus, conversar com ele e um dia passear no Paraíso. Tudo isso graças à encarnação do Verbo de Deus e as maravilhas da ação de Deus desde a concepção de Jesus até o seu mistério pascal. Mas, quando nasceu Jesus Cristo? A tradição unânime fala que ele nasceu em Belém da Judéia no tempo do rei Herodes, como data coloca-se o dia 25 de dezembro do ano 4 a.C. Como se pode ver, isso é um pouco mais complexo, pois com relação ao dia 25 de dezembro, de fato, parece mais uma adaptação, em um determinado tempo da Igreja, do que a data real do nascimento do Salvador. Os primeiros cristãos não tinham o costume de celebrar nascimentos como nós hoje celebramos os aniversários, eles comemoravam o “dies natalis”, isto é, o dia da morte, que equivale ao nascimento para o céu. Neste sentido, os cristãos sabem que Jesus morreu no dia 14/15 de Nissan do ano 30 d.C. Contudo no ano 221 aparece o Sexto Júlio Africano a dar testemunho de que o nascimento de Cristo era celebrado no dia 25 de dezembro.

Dois fatos podem ter contribuído para essa celebração: primeiramente, uma tentativa cristã de “evangelizar” uma festa pagã, a celebração da vitória da luz sobre a noite mais longa do ano (dies natalis solis invicti). Essa explicação tem certo fundamento na visão patrística de que Jesus Cristo é o sol da justiça e a luz do mundo (cf. Ml 3,20; 1 Jo 1,4ss). Em segundo lugar, é a relação que os cristãos faziam entre o dia da morte de Jesus com o dia do seu nascimento e, já que na tradição oriental, o dia da Paixão coincide com o 6 de abril, o nascimento ficou sendo o 6 de janeiro, intercalando 9 meses.

Com relação ao ano do nascimento de Jesus, em princípio seria o ano 753 U.C. (desde a fundação de Roma), segundo os cálculos que, em 526, o monge Dionísio, o Exíguo, propôs à cristandade. 753 ficou sendo, pois, o primeiro ano da nova era cristã. No começo, esse cálculo encontrou resistências, mas foi aceito; e, já no final da Idade Média, estava totalmente estabelecido. Contudo, apesar dos seus esforços, Dionísio errou por alguns anos, pois tendo em conta a data da morte de Herodes, o Grande, transmitida por Flávio Josefo, pode dizer-se que, provavelmente, Jesus nasceu no ano 4 a.C. Aceitando esse ano como o do nascimento de Cristo e tendo como verdadeira a data da crucifixão como sendo o 30 d.C., não o ano 33, como comumente se afirma, Jesus morreu, provavelmente, com 34 anos. A bem da verdade, é preciso dizer também que alguns aceitam o ano provável do nascimento de Jesus, 7 ou 6 a.C., por exemplo, Joseph Ratzinger . Por último, fica a dúvida quanto ao ano certo do nascimento de Jesus, Scott Hahn e Curtis Mitch, após longa explicação, aceitam que Jesus nasceu entre o ano 3 e 2 a.C., o qual faz mais coerente que ele tenha morrido no ano 30 d.C. com uns 33 anos .

O mistério da encarnação é essencial à fé cristã. De fato, uma pessoa não pode ser nem se dizer cristã se não crê nestes dois mistérios: 1º) há um só Deus em três pessoas realmente distintas: Pai e Filho e Espírito Santo (mistério da Santíssima Trindade); 2º) a segunda Pessoa da Santíssima Trindade fez-se carne (encarnou-se = mistério da encarnação), fez-se homem, e chama-se Jesus Cristo. Nasce aquele que se encarnou. Estamos já no meio da história que é, ao mesmo tempo, o princípio do fim. Jesus Cristo nasceu na “plenitude dos tempos” (Gl 4,4) sendo o meio e a plenitude da história. “Há um só mediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo, homem” (1 Tm 2,5). Mediador entre Deus e os homens na sua humanidade, medeia também entre a história profana e a história religiosa. Em Jesus une-se toda a história. Ele é o sentido da criação, da história e da vida dos seres humanos, ou seja, nada se entende sem o Cristo de Deus. Nele unem-se o divino e o humano, o invisível e o visível, o espiritual e o material, o começo e o fim, você e eu. Estamos unidos em Cristo.

Agora entendemos por que esse desejo de que “a graça do Senhor Jesus esteja com todos” (Ap 22,21). Deus eterno (no princípio) veio para salvar-nos (no princípio temporal), para ser meio, ponte, mediador – através da sua própria humanidade – de todas as mulheres e de todos os homens, de toda a criação. O frágil Menino que nasceu em Belém há dois milênios é Deus:  “O Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14)  e chama-se Jesus.

Graças ao fato de Deus ter nascido temporalmente, hoje podemos tê-lo em nossas mãos e em nossos corações. Aproveitemos, portanto, esse momento no qual Deus se apresenta tão pequenino para que nós, os pequenos de Deus, possamos chegar a ser mais plenamente filhos de Deus, agora pela pela graça. Nesta noite chegarão ao presépio muitas pessoas para ver o Divino Infante. Até mesmo Papai Noel chegará para entregar o seu presentinho ao recém-nascido, o Menino Jesus. Claro que sim: estou falando do clássico Papai Noel aos pés do Menino Jesus! Ainda que noutros tempos dediquei-me a falar contra o velhinho bondoso, decidi voltar atrás e reabilitá-lo. Como lemos anteriormente, Cristo reina em todo o universo, e, portanto, naquela manjedoura recebe a homenagem de todos os homens e mulheres. O que tem de mau que também Papai Noel visite o Menino Jesus?

Não nos esqueçamos de que neste Natal o mais importante é que consigamos ir até Belém, participar daquela cena entranhável e dar um presente ao Menino Jesus: vejamos o rosto de Deus em cada rosto humano e presenteemos as pessoas com o nosso sorriso, a nossa generosidade e o nosso espírito de partilha. Não nos esqueçamos de dar-lhes (não a todos universalmente) um presentinho, desses que as lojas vendem: desta maneira ajudaremos também aqueles que são comerciantes. Contudo, evitemos o espírito de consumismo!

Padre Françoá Costa
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