Roteiro Homilético – Quinta-feira Santa

RITOS INICIAIS

 

Gal 6, 14

ANTÍFONA DE ENTRADA: Toda a nossa glória está na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. N’Ele está a nossa salvação, vida e ressurreição. Por Ele fomos salvos e livres.

 

Diz-se o Glória. Enquanto se canta este hino, tocam-se os sinos, que não voltarão a tocar-se até à Vigília Pascal, a não ser que a Conferência Episcopal ou o Ordinário do lugar julguem oportuno estabelecer outra coisa.

 

Introdução ao espírito da Celebração

 

Quinta-feira santa, antes da Páscoa. Jesus reúne-se com os discípulos para a última Ceia e celebra a «primeira Eucaristia», onde ordenou aos Seus discípulos: «Fazei isto em memória de Mim». Cumprindo o mandato de Cristo, hoje celebramos de novo este mistério: Jesus Cristo ficou connosco como nosso alimento e fortaleza no Pão da Eucaristia.

 

ACTO PENITENCIAL

 

Pelas vezes que não celebrámos dignamente a Eucaristia, peçamos perdão ao Senhor:

 

1. Na Eucaristia renova-se a aliança entre Deus e o seu povo. Pelas nossas Eucaristias celebradas apressadamente e que não chegam a aumentar o nosso amor por vós, nós vos pedimos perdão.

Senhor, tende piedade de nós.

 

2. Na Eucaristia é proclamada a Palavra que é Boa Nova. Pelas nossas Eucaristias onde somos surdos à Palavra, e esta não chega a transformar as nossas vidas, nós vos pedimos perdão.

Cristo, tende piedade de nós.

 

3. Na Eucaristia alimentamo-nos com o Pão da Vida. Pelas nossas Eucaristias onde comungamos por rotina, e esta não nos faz crescer no amor fraterno, nós vos pedimos perdão.

Senhor, tende piedade de nós.

 

ORAÇÃO COLECTA: Senhor nosso Deus, que nos reunistes para celebrar a Ceia santíssima em que o vosso Filho Unigénito, antes de Se entregar à morte, confiou à Igreja o sacrifício da nova e eterna aliança, fazei que recebamos, neste sagrado banquete do Seu amor, a plenitude da caridade e da vida. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

 

LITURGIA DA PALAVRA

 

Primeira Leitura

 

Monição: A primeira leitura recorda-nos a Páscoa judaica que era essencialmente uma acção de graças pelas intervenções salvíficas de Deus junto do povo eleito e uma proclamação da sua esperança na libertação definitiva.

 

Êxodo 12, 1-8.11-14

 

1Naqueles dias, o Senhor disse a Moisés e a Aarão na terra do Egipto: 2«Este mês será para vós o princípio dos meses; fareis dele o primeiro mês do ano. 3Falai a toda a comunidade de Israel e dizei-lhe: No dia dez deste mês, procure cada qual um cordeiro por família, uma rês por cada casa. 4Se a família for pequena demais para comer um cordeiro, junte-se ao vizinho mais próximo, segundo o número de pessoas, tendo em conta o que cada um pode comer. 5Tomareis um animal sem defeito, macho e de um ano de idade. Podeis escolher um cordeiro ou um cabrito. 6Deveis conservá-lo até ao dia catorze desse mês. Então, toda a assembleia da comunidade de Israel o imolará ao cair da tarde.7Recolherão depois o seu sangue, que será espalhado nos dois umbrais e na padieira da porta das casas em que o comerem. 8E comerão a carne nessa mesma noite; comê-la-ão assada ao fogo, com pães ázimos e ervas amargas. 11Quando o comerdes, tereis os rins cingidos, sandálias nos pés e cajado na mão. Comereis a toda a pressa: é a Páscoa do Senhor. 12Nessa mesma noite, passarei pela terra do Egipto e hei-de ferir de morte, na terra do Egipto, todos os primogénitos, desde os homens até aos animais. Assim exercerei a minha justiça contra os deuses do Egipto, Eu, o Senhor. 13O sangue será para vós um sinal, nas casas em que estiverdes: ao ver o sangue, passarei adiante e não sereis atingidos pelo flagelo exterminador, quando Eu ferir a terra do Egipto. 14Esse dia será para vós uma data memorável, que haveis de celebrar com uma festa em honra do Senhor. Festejá-lo-eis de geração em geração, como instituição perpétua».

 

Temos aqui, num texto de tipo catequético-litúrgico, a promulgação da lei da Páscoa judaica como «instituição perpétua», a ser festejada por todas as gerações (v. 14). Na origem desta festa da «Páscoa» – dum étimo semítico: salto festivo – parece estar uma antiga festa de pastores nómadas, própria da Primavera, a época em que nascem os cordeiros; então sacrificavam um cordeiro recém-nascido e com o seu sangue faziam ritos a implorar protecção e a fecundidade. Também pela época da Primavera parece que havia outra festa, a dos «Ázimos», com o sentido de novidade e rotura com o passado (o fermento). As duas festas vieram a fundir-se numa só. ATorá terá assumido estas duas festas, dando-lhes o novo e profundo significado que neste texto legal fica bem assinalado, para celebrar a libertação do Egipto.

A ceia pascal é celebrada na noite de 14 para 15 do mês de Nisan (Março/Abril), a noite da lua cheia que se seguia ao equinócio da primavera, pois o 1° dia do mês era o 1º dia da lua nova; então se comiam os pães ázimos, isto é, sem fermento (do grego a-zymê, em hebraico, os matsôth) durante os sete dias da festa, de 15 a 21 de Nisan. O cordeiro imolado recordava aquele outro cordeiro com cujo sangue os israelitas marcaram as suas portas para que o «o flagelo exterminador» ali não atingisse ninguém. A própria palavra «Páscoa», com uma etimologia muito discutida, pode provir do étimo psh, que significa saltar, passar por cima de, prestando-se a significar o flagelo mortal que passou ao largo das casas dos israelitas (cf. Ex 12, 27) na região de Guéssen ou Góxen. Neste texto a palavra é entendida como a passagem do Senhor, a fim de libertar o seu povo. O pão sem fermento lembrava a pressa com que os israelitas saíram do Egipto, tendo de levar consigo a massa do pão antes de ter fermentado (Ex 12, 34.39).

No entanto, a celebração da Páscoa não era para os israelitas uma mera recordação agradecida da libertação duma escravidão passada, mas era algo que os orientava para uma libertação futura completa e definitiva, que se haveria de dar com a vinda do Messias. Havia mesmo uma crença judaica em que o Messias viria numa noite de Páscoa: «nesta noite foram libertados, e nela também serão libertos». Esta alegre esperança manifestava-se no costume, que ainda hoje se mantém, de deixar um lugar vazio à mesa, para alguém que chegue na última hora, que afortunadamente poderia ser o profeta Elias, precursor do Messias. De facto, um dia o próprio Messias havia de se pôr à mesa da ceia pascal, rodeado dos seus discípulos, para então inaugurar a era da autêntica e definitiva libertação. Jesus é o verdadeiro cordeiro pascal (1 Cor 5, 7; Jo 19, 36) que se oferece em sacrifício, com cujo sangue somos redimidos e com cuja carne somos alimentados no banquete eucarístico, prelúdio do banquete celeste (cf. Mc 14, 25). Os samaritanos ainda hoje celebram a Páscoa como se descreve neste texto do Êxodo, sem refeição solene, sem vinho e à pressa. Os judeus celebram-na como refeição solene; já era assim no tempo de Jesus, em razão de já terem saído da escravidão para a liberdade; mas, em vez de comerem sentados como habitualmente, comiam recostados sobre esteiras ou divãs, apoiando-se sobre o braço esquerdo, a partir da época helenística (cf. Lc 22, 14).

 

 

Salmo Responsorial

 Sl 115 (116), 12-13.15-16bc.17-18 (R. cf. 1 Cor 10, 16)

 

Monição: A ceia do Senhor é a Páscoa da Nova Aliança que substitui a do Antigo Testamento. Por isso proclamamos que a comunhão do sangue de Cristo é cálice de bênção.

 

Refrão:         O CÁLICE DE BÊNÇÃO É COMUNHÃO DO SANGUE DE CRISTO.

 

Como agradecerei ao Senhor

tudo quanto Ele me deu?

Elevarei o cálice da salvação,

invocando o nome do Senhor.

 

É preciosa aos olhos do Senhor

a morte dos seus fiéis.

Senhor, sou vosso servo, filho da vossa serva:

quebrastes as minhas cadeias.

 

Oferecer-Vos-ei um sacrifício de louvor,

invocando, Senhor, o vosso nome.

Cumprirei as minhas promessas ao Senhor,

na presença de todo o povo.

 

Segunda Leitura

 

Monição: A ceia do Senhor é a Páscoa da Nova Aliança que substitui a do Antigo Testamento. Cristo foi o definitivo Cordeiro pascal sacrificado durante a Páscoa na cruz e partilhado na ceia eucarística.

 

Coríntios 11, 23-26

 

Irmãos: 23Eu recebi do Senhor o que também vos transmiti: o Senhor Jesus, na noite em que ia ser entregue, tomou o pão e, dando graças, 24partiu-o e disse: «Isto é o meu Corpo, entregue por vós. Fazei isto em memória de Mim». 25Do mesmo modo, no fim da ceia, tomou o cálice e disse: «Este cálice é a nova aliança no meu Sangue. Todas as vezes que o beberdes, fazei-o em memória de Mim». 26Na verdade, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciareis a morte do Senhor, até que Ele venha.

 

Temos aqui o relato da última Ceia, o mais antigo dos quatro que aparecem no N. T., escrito apenas uns 25 anos após o acontecimento. São Paulo diz que isto mesmo já o tinha pregado aos cristãos (v. 23) uns quatro anos atrás, durante os 18 meses em que evangelizou a cidade de Corinto, por ocasião da sua segunda viagem.

23 «Recebi do Senhor»: O original grego (com o uso da preposição apó e não pará) deixa ver que S. Paulo recebeu esta doutrina pela tradição que remonta ao Senhor e não directamente dele, por meio de alguma revelação, como alguém poderia pensar. «Na noite em que ia ser entregue»: Celebramos hoje uma dupla entrega do Senhor, a sua entrega às mãos dos seus inimigos, para a morrer pelos nossos pecados e nos ganhar a vida divina, e a entrega no Sacramento da SS. Eucaristia, como alimento desta mesma vida divina. Para o seu amor infinito, é pouco dar-se todo uma só vez por todos; quer dar-se todo a cada um de nós todas as vezes que nos disponhamos a recebê-lo!

24 «Isto é o Meu Corpo»: A expressão de Jesus é categórica e terminante, sem deixar lugar a mal entendidos. Não diz «aqui está o meu corpo», nem «isto simboliza o meu corpo», mas sim: «isto é o meu corpo», como se dissesse: este pão já não é pão, mas é o meu corpo, isto é, sou Eu mesmo. Todas as tentativas heréticas de entender estas palavras num sentido meramente simbólico, fazem violência ao texto e não têm seriedade. É certo que o verbo «ser» também pode ter o sentido de «ser como», «significar», mas isto é só quando do contexto se possa depreender que se trata duma comparação, o que não se dá aqui, pois não se vê como o pão seja comoo Corpo de Jesus, ou como é que o pode significar. Atenda-se a que Jesus, com a palavra isto não se refere à acção de partir o pão, pois não pronuncia estas palavras enquanto parte o pão, mas depois de o ter partido; portanto não tem sentido dizer que, com a fracção do pão, o Senhor queria representar o despedaçar do seu corpo por uma morte violenta (o corpo entregue). Jesus não podia querer dizer uma tal coisa, pois, se o quisesse dizer, havia de o explicitar, uma vez que o gesto de partir o pão era um gesto usual do chefe da mesa em todas as refeições, não sendo possível ver um outro sentido; por outro lado, o beber do cálice de modo nenhum se podia prestar a um tal sentido.

Os Apóstolos vieram a entender as palavras de Jesus no seu verdadeiro realismo, como aparecem no discurso do Pão da Vida (Jo 6, 51-58). Se Jesus não quisesse dar este sentido realista às suas palavras, também os seus discípulos e a primitiva Igreja não lho podiam dar, porque beber o sangue era algo sumamente escandaloso para gente criada no judaísmo, que ia ao ponto de proibir a comida de animais não sangrados. Se S. Paulo não entendesse estas palavras de Jesus num sentido realista, não teria podido afirmar no v. 27 (omitido na leitura de hoje): «quem comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor»; e no v. 29 fala de «distinguir o corpo do Senhor».

Paulo VI, na encíclica Misterium fidei, rejeitou as explicações teológicas (como a da transignificação e a da transfinalização) que não respeitem suficientemente o realismo da presença real: «Mas para que, ninguém entenda erroneamente este modo de presença, que supera leis da natureza e constitui o maior dos milagres no seu género, é preciso seguir com docilidade a voz da Igreja docente e orante. Pois bem, esta voz, que é um eco perene da voz de Cristo, assegura-nos que Cristo se torna presente neste Sacramento pela conversão de toda a substância do pão no seu corpo e de toda a substância no vinho no seu sangue; conversão admirável e singular à qual a Igreja justamente e com propriedade chama transubstanciação» (atenda-se a que aqui a noção de substância não é a da Física ou da Química, mas a da Metafísica).

24-25 «Fazei isto em memória de Mim». Com estas palavras, Jesus entrega aos Apóstolos (e aos seus sucessores) o poder ministerial de celebrar o Mistério Eucarístico; por isso, Quinta-Feira Santa é o dia do sacerdócio e dos sacerdotes.

25 «A Nova Aliança com o meu Sangue»: Jesus compara o seu sangue, que vai derramar na cruz, ao sangue do sacrifício da Aliança do Sinai (cf. Ex 24, 8), como sendo o novo sacrifício com que se ratifica a Nova Aliança de Deus com a Humanidade, aliança anunciada pelos profetas (Jer 31, 31-33). Na Ceia temos o mesmo sacrifício do Calvário antecipado sacramentalmente através das palavras do próprio Jesus. Na Missa temos igualmente o mesmo sacrifício da Cruz renovado e representado sacramentalmente através da dupla consagração feita pelo sacerdote que actua na pessoa e em nome de Cristo, sendo Ele o mesmo oferente principal, a mesma vítima e sendo os merecimentos os mesmos do único Sacrifício redentor a serem aplicados, Sacrifício oferecido de uma vez para sempre (efápax: cf. Hebr 9, 25-28; 10, 10.18).

26 «Anunciareis a Morte do Senhor»: No altar já não se derrama o sangue de Cristo, como na Cruz, mas oferece-se, de modo incruento, o mesmo sacrifício, renovando e representando sacramentalmente o mistério da mesma Morte que se deu no Calvário.

 

Aclamação ao Evangelho         

Jo 13, 34

 

Monição: Como filhos amados de Deus e unidos uns aos outros no mesmo amor, aclamemos a Cristo, Palavra de Deus..

 

Dou-vos um mandamento novo, diz o Senhor:

amai-vos uns aos outros como Eu vos amei.

 

 

Evangelho

 

São João 13, 1-15

 

1Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, Ele, que amara os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim.2No decorrer da ceia, tendo já o Demónio metido no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, a ideia de O entregar, 3Jesus, sabendo que o Pai Lhe tinha dado toda a autoridade, sabendo que saíra de Deus e para Deus voltava, 4levantou-Se da mesa, tirou o manto e tomou uma toalha que pôs à cintura. 5Depois, deitou água numa bacia, e começou a lavar os pés aos discípulos e a enxugá-los com a toalha que pusera à cintura. 6Quando chegou a Simão Pedro, este disse-Lhe: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?»7Jesus respondeu: «O que estou a fazer, não o podes entender agora, mas compreendê-lo-ás mais tarde». 8Pedro insistiu: «Nunca consentirei que me laves os pés». Jesus respondeu-lhe: «Se não tos lavar, não terás parte comigo». 9Simão Pedro replicou: «Senhor, então não somente os pés, mas também as mãos e a cabeça». 10Jesus respondeu-lhe: «Aquele que já tomou banho está limpo e não precisa de lavar senão os pés. Vós estais limpos, mas não todos». 11Jesus bem sabia quem O havia de entregar. Foi por isso que acrescentou: «Nem todos estais limpos». 12Depois de lhes lavar os pés, Jesus tomou o manto e pôs-Se de novo à mesa. Então disse-lhes: «Compreendeis o que vos fiz?13Vós chamais-Me Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque o sou. 14Se Eu, que sou Mestre e Senhor, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. 15Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu fiz, vós façais também».

 

1. «Antes da festa da Páscoa». A ceia de que aqui se fala (v. 2) não é descrita como sendo a Ceia Pascal dos Sinópticos (Mt 26, 17-35; Mc 14, 12-31; Lc 22, 7-39), mas não pode ser outra, por se tratar da mesma da noite em que Jesus foi preso. Se S. João se limita a dizer «antes da festa da Páscoa», sem precisar que era a véspera (a Preparação), é porque ele quer que se entenda a morte de Jesus como a imolação do cordeiro pascal, ao colocá-la no mesmo dia (a Preparação: 19, 31.42) em que no templo eram imolados os cordeiros para a festa; sendo assim, evita intencionalmente o dar à Última Ceia qualquer carácter pascal; e pensamos que esta pode ser uma séria razão para não falar da instituição da Eucaristia, aliás referida no discurso do Pão da Vida (cf. Jo 6, 51-58). «Amou-os até ao fim», isto é, até à consumação (19, 30), indicando o seu amor de total entrega, até à morte (cf. 15, 13; 1 Jo 3, 16; Gal 2, 20), embora com esta não termine o seu amor, pois «não só até aqui nos amou quem nos ama sempre e sem fim» (Santo Agostinho); a expressão poderia aludir também ao amor posto na realização da Eucaristia de que S. João não conta a instituição, naturalmente por já lhe ter dedicado todo o capítulo VI e, como já se disse, para evitar dar a esta ceia um carácter pascal. Outra tradução possível: «levou o seu amor por eles até ao extremo». Jesus não só amou os seus até ao último momento da sua vida terrena, mas não podia amá-los mais: amou-nos até à loucura da Cruz e da Eucaristia.

3 «Jesus, sabendo…». Lavar os pés era um ofício exclusivo de escravos (1 Sam 25, 41) e os rabinos chegavam a explicitar que só se devia impor esse humilhante serviço a escravos que não fossem da raça hebraica, baseando-se em Lv 25, 39. Jesus, ao sujeitar-se a esse trabalho aviltante, tem bem presente o seu poder e a sua dignidade de Filho de Deus. A oposição decidida de Pedro mostra o profundo choque causado pela atitude do Senhor. Não se pode estabelecer o momento exacto do lava-pés, pois não estavam previstas lavagens dos pés na Ceia, mas apenas o lavar das mãos; o que Jesus realiza é antes de mais uma acção simbólica, à maneira dos profetas. Talvez a discussão travada na Ceia sobre quem seria o maior dos Apóstolos (cf. Lc 22, 24) tenha levado Jesus a dar-lhes uma lição com o seu gesto: é maior aquele que mais serve. Aparecem dois significados no gesto de Jesus: um simbólico e outro de exemplo a imitar. Nos vv. 6-11, sobressai mais o valor simbólico: Jesus é quem purifica os seus dos seus pecados e sem isso não se pode ter parte com Ele (v. 8), purificação que é um efeito da sua Morte redentora. Nos vv. 14-15, Jesus propõe o seu exemplo para ser imitado: «Eu vos lavei os pés, sendo Mestre e Senhor, também vós deveis lavar os pés uns aos outros», isto é, prestar aos outros todos os serviços, mesmo os mais humildes e humilhantes. Ter autoridade na Igreja (e também na sociedade civil) não é ter à disposição os outros para ser servido, mas é estar à disposição de todos para os servir eficazmente. A vida cristã consiste em imitar o exemplo de Jesus Cristo: 1 Pe 2, 21; 1 Jo 2, 6; Fil 2, 5; 1 Cor 11, 1; Ef 5, 1; 1 Tes 1, 6…

 

Sugestões para a homilia

 

Dia do amor fraterno

Instituição da Eucaristia

Instituição do Sacerdócio

 

A Quinta-feira Santa, primeiro dia do Tríduo Pascal, marca uma celebração capital dentro de todo o ano litúrgico, celebração solene e grandiosa emoldurada no contexto dramático da proximidade da paixão e morte do Senhor. É o dia cume da despedida e do amor extremo feito serviço humilde e generoso. Muitas são as facetas que se entrecruzam num dia como este. Vejamos as principais:

Dia do amor fraterno

Hoje ressoa na comunidade o mandamento novo, mandamento do amor, do amor «como eu vos tenho amado». «Amei-vos até o fim», até fazer-me servo e escravo num tipo de serviço considerado humilhante e próprio dos escravos (lavar os pés). «Eu dei-vos o exemplo». «Vós também deveis lavar os pés uns dos outros.» Trata-se de uma proclamação do mandamento do amor feita não com palavras mas com um sinal prático, o serviço. Amar é servir. Ama quem serve. Obras são amores.

Instituição da Eucaristia

Para o evangelista São João, a instituição da Eucaristia está ligada estreitamente ao lava-pés. A Eucaristia expressa e constitui o sacramento do amor de uma maneira visível, assim como o lava-pés. Jesus parte e reparte o pão e o vinho, e diz: «Fazei isto em minha memória», ou seja: para recordar-me fazei isto; ou também: partir e repartir a própria existência será a forma de seguimento que melhor testemunha e faz memória de mim. Celebrar a Eucaristia, fracção do pão, será sempre muito mais que ouvir a Missa: «Cada vez que comemos deste pão… anunciamos a morte do Senhor até que Ele venha.»

Instituição do Sacerdócio

A Igreja recorda que ao instituir a Eucaristia, Cristo também institui o sacerdócio da Nova Aliança. Diz o Santo Padre: «O sacerdote é o homem que guiado pela fé tem acesso aos bens que constituem a herança da Redenção realizada pelo Jesus Cristo que o escolheu para ser o administrador da riqueza da Palavra e dos Sacramentos», e cuja qualidade fundamental é como ensina S. Paulo a fidelidade (cf. 1 Cor 4, 2). O padre dá a Cristo a sua própria humanidade que dela se serve como instrumento de salvação, e «esta doação – admirabile commercium – torna-o um outro eu.» Este é o cerne da vocação sacerdotal. O padre é um expropriado de si próprio que na renúncia a tudo por Cristo descobre que a sua personalidade se realiza plenamente por este caminho, a via da entrega total e do amor sem limites.

 

Olhando para Maria, a verdadeira discípula de Cristo que amava a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesma, e seguindo os passos de São Paulo que fez tudo para todos (cf. 1 Cor 9, 22), procuremos praticar «com todo o nosso coração e com toda as nossas forças», o mandamento novo para edificarmos, quanto antes, a «civilização do amor».

 

Na homilia comentam-se os grandes mistérios que neste dia se comemoram: a instituição da sagrada Eucaristia e do sacramento da Ordem e o mandato do Senhor sobre a caridade.

 

Lava-pés

 

Fala o Santo Padre

 

«Deus desce até à extrema baixeza da nossa queda:

Ajoelha-se diante de nós e lava os nossos pés sujos, para que possamos ser admitidos à Sua mesa.»

 

«Ele, que amara os seus que estavam no mundo, levou o seu amor por eles até ao extremo» (Jo 13, 1): Deus ama a sua criatura, o homem; ama-o também na sua queda e não o abandona a si mesmo. Ele ama até ao fim. Vai até ao fim com o seu amor, até ao extremo: desce da sua glória divina. Depõe as vestes da sua glória divina e reveste-se com as do servo. Desce até à extrema baixeza da nossa queda. Ajoelha-se diante de nós e presta-nos o serviço do servo; lava os nossos pés sujos, para que possamos ser admitidos à mesa de Deus, para que nos tornemos dignos de nos sentarmos à sua mesa o que, por nós mesmos, nunca podemos nem devemos fazer.

Deus não é um Deus distante, demasiado distante e grande para se ocupar das nossas insignificâncias. Porque Ele é grande, pode interessar-se também pelas coisas pequenas. Porque Ele é grande, a alma do homem, o mesmo homem criado para o amor eterno, não é uma coisa pequena, mas grande e digna do seu amor. A santidade de Deus não é só um poder incandescente, diante do qual nós nos devemos retirar aterrorizados; é poder de amor e por isso é poder que purifica e restabelece.

Deus desce e torna-se escravo, lava-nos os pés para que possamos estar na sua mesa. Exprime-se nisto todo o mistério de Jesus Cristo. Nisto se torna visível o que significa redenção. O banho no qual nos lava é o seu amor pronto para enfrentar a morte. Só o amor tem aquela força purificadora que nos tira a nossa impureza e nos eleva às alturas de Deus. O banho que nos purifica é Ele mesmo que se doa totalmente a nós até às profundidades do seu sofrimento e da sua morte. Ele é continuamente este amor que nos lava; nos sacramentos da purificação o baptismo e o sacramento da penitência, Ele está continuamente ajoelhado diante dos nossos pés e presta-nos o serviço do servo, o serviço da purificação, torna-nos capazes de Deus. O seu amor é inexaurível, vai verdadeiramente até ao fim.

«Vós estais limpos, mas não todos», diz o Senhor (Jo 13, 10). Nesta frase revela-se o grande dom da purificação que Ele nos faz, porque deseja estar à mesa juntamente connosco, deseja tornar-se o nosso alimento. «Mas não todos» existe o obscuro mistério da recusa, que com a vicissitude de Judas nos torna presentes e, precisamente na Quinta-Feira Santa, no dia em que Jesus faz a oferenda de Si, nos deve fazer reflectir. O amor do Senhor não conhece limites, mas o homem pode pôr-lhe um limite.

«Vós estais limpos, mas não todos»: o que é que torna o homem impuro? É a recusa do amor, o não querer ser amado, o não amar. É a soberba que julga não precisar de purificação alguma, que se fecha à bondade salvífica de Deus. É a soberba que não quer confessar nem reconhecer que precisamos de purificação. Em Judas vemos a natureza desta recusa ainda mais claramente. Ele avalia Jesus segundo as categorias do poder e do sucesso: para ele só o poder e o sucesso são realidades, o amor não conta. E ele é ávido: o dinheiro é mais importante do que a comunhão com Jesus, mais importante do que Deus e o seu amor. E assim torna-se também mentiroso, ambíguo e vira as costas à verdade; quem vive na mentira perde o sentido da verdade suprema, de Deus. Desta forma ele endurece-se, torna-se incapaz da conversão, da volta confiante do filho pródigo, e deita fora a vida destruída.

«Vós estais limpos, mas não todos». Hoje, o Senhor admoesta-nos perante aquela auto-suficiência que põe um limite ao seu amor ilimitado. Convida-nos a imitar a sua humildade, a confiar-nos a ela, a deixar-nos «contagiar» por ela. Convida-nos por muito desorientados que nos possamos sentir a voltar para casa e a permitir que a sua bondade purificadora nos reanime e nos faça entrar na comunhão da mesa com Ele, com o próprio Deus.

Acrescentamos uma última palavra deste inexaurível texto evangélico: «dei-vos exemplo…» (Jo 13, 15); «também vós vos deveis lavar os pés uns aos outros» (Jo 13, 14). Em que consiste «lavar os pés uns aos outros»? Que significa concretamente? Eis que, qualquer obra de bondade pelo outro especialmente por quem sofre e por quantos são pouco estimados é um serviço de lava-pés. Para isto nos chama o Senhor: descer, aprender a humildade e a coragem da bondade e também a disponibilidade de aceitar a recusa e contudo confiar na bondade e perseverar nela. Mas existe ainda uma dimensão mais profunda. O Senhor limpa-nos da nossa indignidade com a força purificadora da sua bondade. Lavar os pés uns aos outros significa sobretudo perdoar-nos incansavelmente uns aos outros, recomeçar sempre de novo juntos, mesmo que possa parecer inútil. Significa purificar-nos uns aos outros suportando-nos mutuamente e aceitando ser suportados pelos outros; purificar-nos uns aos outros doando-nos reciprocamente a força santificadora da Palavra de Deus e introduzindo-nos no Sacramento do amor divino.

O Senhor purifica-nos e, por isso, ousamos aceder à sua mesa. Peçamos-lhe que conceda a todos nós a graça de podermos ser, um dia e para sempre, hóspedes do eterno banquete nupcial.

Amém!

Papa Bento XVI, Basílica de São João de Latrão, 13 de Abril de 2006

 

Oração Universal

 

Oremos, irmãos, a Deus nosso Pai, por intermédio de Jesus Cristo,

que se fez alimento para saciar a nossa fome de eternidade,

dizendo:

 

1.  Por todos os cristãos que no dia de hoje se reúnem

para comungar o Corpo de Cristo;

para que se sintam mais fortes na luta contra o mal

e mais corajosos para o bem,

oremos, irmãos.

 

2.  Por todos os que partilham do seu pão com os seus irmãos que passam fome

para que o seu exemplo seja seguido

por quem ainda se fecha no egoísmo e se recusa a partilhar,

oremos, irmãos.

 

3.  Por todos os que ganham o pão de cada dia com dificuldade e por todos os desempregados:

para que sejam recordados por aqueles

que dirigem a economia e fazem projectos de futuro,

oremos, irmãos.

 

4.  Por todos nós aqui reunidos nesta Eucaristia, nesta festa do Corpo de Cristo:

para que as nossas celebrações eucarísticas tenham vida e dinamismo,

e nos façam crescer no amor

oremos, irmãos.

 

Outras intenções

 

Senhor, nosso Deus, dai-nos o pão de cada dia

e nunca nos falteis com o pão vivo descido do céu.

Por Nosso Senhor…

 

 

LITURGIA EUCARÍSTICA

 

Ao iniciar-se a liturgia eucarística, pode organizar-se uma procissão dos fiéis com oferta para os pobres.

Entretanto, canta-se a antífona Ubi caritas ou outro cântico apropriado.

 

ORAÇÃO SOBRE AS OBLATAS: Concedei-nos, Senhor, a graça de participar dignamente nestes mistérios, pois todas as vezes que celebramos o memorial deste sacrifício realiza-se a obra da nossa redenção. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

Prefácio da Santíssima Eucaristia: p. 1254 [658-770]

 

SANTO

 

Monição da Comunhão

 

Senhor Jesus Cristo, vós dissestes aos vossos Apóstolos: «Tomai e comei todos». Que todos nós, que hoje comemos do mesmo pão, vivamos unidos num mesmo amor, numa mesma caridade. Vós que viveis com o Pai na unidade do Espírito Santo.

 

1 Cor 11, 24.25

ANTÍFONA DA COMUNHÃO: Isto é o meu Corpo, entregue por vós; este é o cálice da nova aliança no meu Sangue, diz o Senhor. Fazei isto em memória de Mim.

 

Terminada a distribuição da comunhão, deixa-se sobre o altar a píxide com as partículas para a comunhão do dia seguinte. A Missa conclui com a oração depois da comunhão:

 

ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO: Deus eterno e omnipotente, que hoje nos alimentastes na Ceia do vosso Filho, saciai-nos um dia na ceia do reino eterno. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.

 

TRASLADAÇÃO DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO

 

Terminada a oração, o sacerdote, de pé, diante do altar, põe incenso no turíbulo e, de joelhos, incensa por três vezes o Santíssimo Sacramento. Em seguida, toma o véu de ombros, pega na píxide e cobre-a com as extremidades do véu.

Organiza-se a procissão, com círios e incenso, indo à frente o cruciferário com a cruz, e leva-se o Santíssimo Sacramento, através da igreja, para o lugar da reserva, preparado numa capela convenientemente ornamentada. Entretanto canta-se o hino Pange, lingua (Canta, Igreja, o Rei do mundo) – excepto as duas últimas estrofes – ou outro cântico apropriado.

Chegada a procissão ao lugar da reserva, o sacerdote depõe a píxide. Seguidamente, põe incenso no turíbulo e, de joelhos, incensa o Santíssimo Sacramento. Entretanto canta-se o Tantum ergo sacramentum. Depois fecha-se o tabernáculo ou urna da reserva.

Depois de algum tempo de oração em silêncio, o sacerdote e os ministros fazem a genuflexão e retiram-se para a sacristia.

Segue-se a desnudação do altar e, se possível, retiram-se as cruzes da igreja. Se algumas ficam na igreja, é conveniente cobri-las.

Os que tomaram parte na Missa vespertina não são obrigados à celebração das Vésperas.

Exortem-se os fiéis, tendo em conta as circunstâncias e as diversas situações locais, a dedicar algum tempo da noite à adoração do Santíssimo Sacramento. A partir da meia noite, porém, esta adoração faz-se sem solenidade.

 

 

RITOS FINAIS

 

Monição final

 

Somos convidados a mudar o nosso coração a fim de acolher a Boa Nova da Páscoa e semear em todos a alegria e o amor de Deus, que quer morar connosco, especialmente na Eucaristia. Agora, ide e proclamai com a vossa alegria que o Senhor nos chama ao banquete da sua alegria eterna. Ide em paz.

 

 

 

 

 

Celebração e Homilia:          NUNO WESTWOOD

Nota Exegética:                     GERALDO MORUJÃO

Sugestão Musical:                 DUARTE NUNO ROCHA

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